segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Coincidência ou Providência?

No dia 14 de maio de 1948, a Organização das Nações Unidas, em sessão presidida pelo embaixador brasileiro Oswaldo Aranha, aprovou a criação do moderno Estado de Israel.

No Calendário judaico tal data correspondia ao ano 5708. Na Toráh hebraica, o versículo nº 5708 corresponde a Deuteronômio 30,5: “E te trará o Eterno, teu D-us, à terra que herdaram teus pais, e a herdarás; e te fará bem e te multiplicará mais do que a teus pais”. Apenas coincidência?

Abraão, considerado o primeiro judeu, nasceu quando o Calendário judaico marcava o ano 1948. Em 14/05/1948, da Era Comum, comemorou-se o primeiro dia da Pátria (Yom Haatsmaút). Outra coincidência? Acredito que não. Creio na mão de D-us escrevendo conosco a história.

Esses e outros episódios interessantes você poderá ver no livro “O mais completo guia sobre o judaísmo”, do Rabino Benjamin Blech, Editora Sefer, São Paulo, 2004. Esses, ora citados, estão nas páginas 128 e 203.

Prof. Ismar Dias de Matos

Obs: Artigo dedicado a Clécia Kalic. Ab immo pectore.

quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Matar o tempo é suicídio!

Matar alguém é homicídio, diz nosso Código Penal, artigo 121. Se tempo é dinheiro, matar o tempo é loucura; só louco rasga dinheiro. Matar o tempo é... suicídio!

sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Testamento de Dom Joaquim Silvério de Souza

“Em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo. Amém.

Por este instrumento, por mim escrito, datado e assinado, para valer como meu codicilo, de acordo com os artigos 1651 e 1655 do Código Civil Brasileiro, eu Joaquim Silvério de Souza, primeiro Arcebispo da Arquidiocese de Diamantina, filho do Capitão Antônio de Souza Monteiro e Dona Anna Felícia Policena de Magalhães, estando em pleno gozo de minhas faculdades mentais, faço esta declaração do que se deve cumprir após meu falecimento e para que se saiba a verdade quanto aos bens por mim havidos ou como tais considerados, ou sob minha administração.

Como é meu dever, agradeço a Deus todas as graças espirituais e temporais a mim concedidas, e humildemente lhe suplico perdão de todos os pecados, infidelidades à graça, negligências, omissões, de que me tornei culpado durante o curso da vida, e de modo particular no exercício do ministério sacerdotal e pastoral.

No propósito de exalar o último alento firme na fé de tudo quanto ensina a Santa Igreja Católica, em cujo seio tenho a felicidade de viver, e da qual apesar de indigno, tenho a honra de ser ministro, entrego minha alma a Deus pelas mãos de Maria Imaculada, cujo especial amparo, assim como o patrocínio de seu castíssimo esposo, São José, a proteção de São Joaquim, de Santo Antônio, principal Patrono da Arquidiocese, do meu Anjo Custódio, invoco para os meus derradeiros momentos de vida na terra.

Não só aos que mais de perto me ajudaram a levar o peso da administração do Arcebispado, mas a todos os sacerdotes e fiéis sob minha jurisdição, os agradecimentos a quem têm direito pelos serviços que prestaram e consolações que deram à minha alma, e a quem de qualquer modo contristei os sentimentos do meu pesar e o pedido de sua indulgência para comigo.

Desejo que as Missas a que tenho direito e as que deixo recomendadas sejam celebradas quanto antes. Dos sacerdotes e fiéis deste Arcebispado e das Dioceses que outrora formaram o Bispado de Diamantina, e são hoje sufragâneas desta Igreja Metropolitana, espero a caridade de suas intercessões diante de Deus em meu favor.

Na campa da sepultura que recolher meus ossos, desejo, caso seja possível, se leiam, como contínua invocação minha, as palavras: SPES MEA, DOMINE, MISERICORDIA TUA.
Declaro que de meu não possuo coisa alguma.

A meus irmãos ou a filhos seus dei, já há anos, por instrumento legal, e observada também a legislação canônica, alguns alqueires de terra que na Freguesia de São Miguel do Piracicaba (atual Vila Rio Piracicaba) constituíram por doação de meus pais, patrimônio para minha ordenação, e no mesmo fim dispus da pequena herança destes havida.

Como consta de certidão oficial existente na Secretaria do Arcebispado, dei à Mitra Arquidiocesana os livros que me pertenciam e para ela foram adquiridos os posteriores à doação.
A ela pertencem todos os paramentos, imagens, alfaias, sacros utensílios, objetos de qualquer natureza existentes no Palácio e que não pertençam a outras pessoas.

Simples administrador dos bens da Mitra, nada para mim reservei ainda do que me podia pertencer segundo as leis canônicas, mas tudo, tirado o necessário para minha manutenção, empreguei para o bem da Arquidiocese, principalmente na educação da juventude e amparo das vocações sacerdotais.
Tendo em vida feito o que pude aos que me são mais próximos em sangue, como declarado ficou acima, e não podendo lhes deixar bens temporais, que não possuo, peço que vivam sempre como bons filhos da Igreja e mantenham honrado o nosso nome de família.

Aos Exmos. Srs. Dom Antônio José dos Santos, que me tem feito a caridade de sua valiosa cooperação durante anos e, na sua falta, a Monsenhor Levi Pires de Oliveira, e, no impedimento deste, a Monsenhor Gabriel Amador dos Santos ou a seu sucessor na Secretaria do Arcebispado, aos quais todos renovo minha eterna gratidão, rogo o favor de fazer que se execute, de acordo com a legislação do País, esta minha disposição ou declaração de última vontade.

Rogo, enfim, a Deus que me conceda a graça de servi-Lo menos imperfeitamente do que até hoje, durante os dias que por sua infinita misericórdia ainda viver sobre a terra (*).

Diamantina, 09 de fevereiro de 1929.

Dom Joaquim, Arcebispo de Diamantina”.

Obs: Eu, Ismar Dias de Matos, sou associado efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais e ocupo a cadeira 75, cujo patrono é Dom Joaquim Silvério de Souza.

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(*) Dom Joaquim faleceu no dia 30 de agosto de 1933, em Diamantina. Em 1959, quando completaria 100 anos, foi homenageado com a edição de um selo postal, certamente homenagem de JK.

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Respeito para com o Nome do Eterno

O livro dos Salmos, em hebraico, traz uma curiosidade salutar. A numeração segue a ordem das letras do Alef-Beit: Um é o Álef, Dois é o Beit, e assim por diante, como se pode ver no relógio da ilustração deste artigo. Mas quando se chega ao Salmo 15, a numeração muda: onde deveríamos encontrar a combinação 10 + 5, encontramos 9 + 6. Por quê? Porque partiríamos ao meio o nome do Senhor - retiraríamos o Yud e o Hêi, primeira e segunda letras, da direita para a esquerda -, conforme consta no escrito abaixo do relógio, na ilustração. O mesmo se dá com o Salmo 16: consta a numeração 9 + 7, e não 10 + 6, porque o número seis é o Váv, que também está no nome do Eterno, como terceira letra.
Esse cuidado para não partir o Tetragrama Sagrado acontece também na numeração dos versículos 15 e 16 de cada Salmo, bem como nos mesmos versículos dos demais capítulos dos livros do Tanach, a bíblia hebraica.
Eis aí um saudável respeito para com o Nome Divino. (Prof. Ismar Dias de Matos, PUC Minas)

Obs: Dedico esse Artigo à Professora Elza Riedel - Grande Moráh - que tem me ajudado tanto na compreensão do Hebraico.

segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Exaltação da Santa Cruz

Nesta terra brasileira, que já se chamou Ilha de Vera Cruz e Terra de Santa Cruz, é comum ver as pessoas se persignarem com o Sinal da Cruz: “Pelo sinal da Santa Cruz, livrai-nos, Deus, Nosso Senhor, de nossos inimigos”...

É muito grande a devoção de nosso povo à Santa Cruz, o santo lenho no qual o nosso Salvador deu a vida por nós. É gesto comum pelos interiores do Brasil, no dia 3 de maio de cada ano, a ornamentação das cruzes, às quais são coladas flores e papeis multicoloridos; ao redor desse Santo Lenho as pessoas se reúnem para rezar, desde antiquíssimas eras.

Provavelmente foi em 3 de maio de 1500 que os primeiros portugueses desembarcaram em nossas terras, daí o nome que deram ao local, como disse acima.

Segundo a tradição lendária, Santa Helena, mãe do imperador romano Constantino Magno, encontrou, em 3 de maio de 326, três cruzes soterradas no lugar que se chamava Gólgota, e concluiu que eram as mesmas daquela Sexta-Feira Santa, de três séculos atrás. Como descobrir qual era a cruz em que o Salvador teria sido crucificado? Segundo a mesma tradição, um cadáver fora colocado sobre uma das cruzes, sem que nada de notável acontecesse; assim aconteceu com uma segunda cruz; nada aconteceu; mas ao ser colocado sobre a terceira cruz, o cadáver ganhou vida, testemunhando assim que aquela teria sido a Cruz Salvadora. Essa data, então, começou a ser celebrada como a Descoberta ou Invenção da Santa Cruz (Invenire, em latim, significa descobrir). Com a mudança conciliar do Vaticano II, a festa litúrgica passou para o dia 14 de setembro, com o nome de “Exaltação da Santa Cruz”. Algumas comunidades Anglicanas celebram, nessa data, o “Santo Dia da Cruz”, nome também usado por Luteranos.

Exaltação tem como sinônimo a palavra “Triunfo”, para nos dizer que a Cruz não é, para nós, símbolo de morte, mas de vida. A festa litúrgica da Exaltação nos diz que a Cruz de Cristo é a chave de vida nova, pois pela cruz chegaremos à Luz. (Prof. Ismar Dias de Matos)

O deus Cabirus

Os habitantes de Tessalônica, nos tempos do Apóstolo Paulo, praticavam um solene culto a Cabirus, que foi assassinado por seus dois irmãos, com quem formava trigêmeos, e tornou-se um heroi. Foi enterrado junto com os símbolos da realeza. Normalmente, Cabirus é apresentdo como uma divindade, de pé, com o capacete na cabeça, um martelo na mão direita, e pinças em sua esquerda, lembrando os atributos de seu pai Vulcano, o deus da Metalurgia.

Filho de Vulcano e Cabira, Cabirus dedicava-se aos pobres e marginalizados, que acreditavam na volta de seu heroi, como uma volta messiânica e salvadora. Cabirus salvaria a cidade e restauraria a justiça entre seus habitantes.

O culto litúrgico incluía sacrifícios de sangue e envolvia todas as classes sociais dos tessalonicences.

O Imperador romano dizia ser uma encarnação de Cabirus e, portanto, era o merecedor de todas as honras atribuídas ao filho de Vulcano.

Fazendo menção às indumentárias do heroi de Tessalônica, o Apóstolo Paulo convida os tessalonicenses a se precaverem do mal: “Sejamos sóbrios, revestidos da couraça da fé e da caridade, e do capacete da esperança da salvação” (1 Ts 5,8). Em lugar de Cabirus, Paulo anuncia Jesus Cristo aos habitantes daquela importante cidade da Macedônia. (Prof.Ismar Dias de Matos)

segunda-feira, 11 de agosto de 2014

O sentido da dor e do sofrimento

No dia 11 de fevereiro deste ano, a Carta Apostólica “Salvifici Doloris” (SD), de São João Paulo II, completou 30 anos. Ela começa com o versículo 24 de Colossenses 1: “Completo na minha carne — diz o Apóstolo São Paulo, ao explicar o valor salvífico do sofrimento — o que falta aos sofrimentos de Cristo em favor de seu Corpo, que é a Igreja”.

Faço essa memória porque as leituras bíblicas de domingos atrasados nos falaram sobre dor e o sofrimento. Começavam com Jó, o justo sofredor inocente, protótipo do próprio Jesus. O trecho escolhido (7,1-4.6-7) nos apresenta um homem sofrido, amargurado e sem esperanças, que sente a vida frágil, como um sopro, e cujos olhos não têm a certeza de ver outra vez a felicidade. Ele sabe que não merece o sofrimento, como querem justificar seus amigos Elifaz, Sofar e Baldad. Em outro trecho do livro, no capítulo 3, Jó chega a lamentar o dia em que nasceu, tamanha é a sua dor. Ele “briga” com Deus, não é o homem paciente e quieto como muitos erroneamente dizem. Jó, hoje, é João, José, Maria, Tião, Tereza, pessoas empobrecidas e sofridas, apesar disso, justas e confiantes em Deus.

O Evangelho de Marcos (1, 29-39) nos relata, num primeiro momento, a primeira cura física de Jesus: a cura da sogra de Pedro, que estava com febre, e febre alta (Lc 4, 38-39). O evangelista nos conta que à tarde levaram a Jesus todos os doentes e os possuídos pelo demônio. A cidade de Cafarnaum parou para ver o espetáculo que Jesus faria. Não aconteceu um espetáculo: “Jesus curou muitas pessoas de diversas doenças e expulsou muitos demônios” (Mc 1, 34). Não curou a todos. Por quê?

O milagre, certamente, não era o ponto central da missão de Jesus. Também hoje as pessoas querem milagres e dizem que eles são sinal atestador da presença viva de Cristo numa dada Igreja. Herodes queria ver um milagre; Jesus não fez nenhum espetáculo miraculoso para ele (Lc 23, 8-12).

Retomando o Evangelho, vemos que enquanto o povo se amontoava à frente da casa da sogra de Pedro, para ser curado, Jesus retirou-se para um lugar afastado e foi orar. Os discípulos foram atrás: “todos estão te procurando” (Mc 1, 37). E Jesus respondeu: “Vamos a outros lugares, às aldeias da redondeza! Devo pregar também ali, pois foi para isso que eu vim” (Mc 1, 38). Jesus não queria um “show” para aquelas pessoas. O que Jesus quer é “responder-lhes da Cruz, do meio do seu próprio sofrimento”, como nos lembra São João Paulo II, na SD nº 26.

Jesus é o Deus Solidário na alegria e na tristeza. Ele é Irmão que está ao lado dos doentes crônicos que convivem anos a fio com uma doença incurável, mas que pode tornar-se uma mestra e pedagoga para quem a sofre com prudência, trazendo-lhe uma cura espiritual, de modo que se torne uma pessoa mais humana, mais humilde, mais fraterna.

Ismar Dias de Matos, sacerdote da Diocese de Guanhães-MG.

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Os signos e as Tribos de Israel

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Há uma grande relação entre os 12 signos do Zodíaco e as 12 Tribos de Israel, a ponto de o Talmud afirmar que “o reinado daqui é um reflexo do reinado de lá”.

O primeiro signo, Áries (Carneiro), representa a Tribo de Judá, da qual veio o Rei David e os monarcas importantes, inclusive Jesus, o Messias. Áries representa o primeiro mês, o líder dos meses.
O segundo signo, Touro, representa a Tribo de Issacar e o segundo mês (Iyar), que é o mês preparatório para o recebimento da Lei (Torá).

Gêmeos, o terceiro signo, representa a Tribo de Zabulon e o mês de Sivan. Deus e o Povo são os gêmeos, ou seja, Céus e Terra, e também a Torá Escrita e a Torá Oral.

No quarto mês (Tamuz, com o signo de Câncer) há uma rebelião de Rubem contra Moisés, num episódio triste.
O Leão, que representa a Tribo de Simeão e o mês de Av, representa algo negativo também, pois Zimri, um dos líderes de Israel, se une a Cozbi, uma midianita, o que resultou em muitos mortos israelitas.

O sexto signo é Virgem, e representa Pureza e Santidade. Simboliza o mês da volta para Deus (Teshuvá), no mês de Gad.
No mês de Tishrei ocorrem as festas de Ano Novo (Rosh Hashaná), entre outras. O mês é representado pela Balança, em referência aos nossos atos e o julgamento de Deus.

Escorpião (Acar Beit = aquele que destrói a casa, destrói o mundo) representa o mês de Chesvan, o mês do Dilúvio.

Sagitário (Kislev) Durante este mês, trabalhamos em “correto relaxamento” ou sono, que resulta de nossa dedicação à “ação correta” durante nossas horas de atividade. O nome da letra deste mês, samech (s), significa “confiança”. Nossa confiança verdadeira em Deus nos dá a certeza de afirmar nossa santidade e resistir àqueles que a desafiam. Isso está refletido na celebração de Chanucá, e o signo astrológico de Sagitário, o arqueiro. “Relaxamento correto”, usando o descanso como um meio para a ação adequada, nos ajuda a canalizar nossos esforços (“mirando” nosso arco) na direção correta. Da mesma forma, a tribo deste mês, Benjamin, possuía valentes guerreiros. Seu território continha o local do Templo Sagrado, aonde nossas preces e sonhos são dirigidos.

Capricórnio (Tevet) Este mês cultivamos “a ira correta”. O Talmud nos diz para sempre considerarmos os outros favoravelmente, e que a ira é algo que quase sempre deve ser evitada. Mas existe também uma ira positiva, o senso de o que rejeitar. O nome da tribo deste mês, Dan, significa “julgar”. A letra deste mês, ayin, significa “olho”. Temos dois olhos para discernir constantemente o que aceitar na vida, e o que rejeitar. A capacidade de constantemente rejeitar o negativo é simbolizada por Capricórnio, a cabra, conhecida por sua tenacidade.

Aquário (Shevat) A festa deste mês, Tu Bishvat, é celebrada comendo-se frutos da árvore, refletindo o atributo deste mês, “alimentar-se corretamente”. A letra deste mês, tsadic (ts), significa “justo”, lembrando-nos do versículo “os justos alimentam-se para nutrir a alma”. O verdadeiro teste de nossa espiritualidade é se tornamos a alimentação (e todas as nossas outras atividades mundanas) uma experiência espiritual, ou se nos rendemos à gratificação sensorial. Purificando nossas atitudes quanto à materialidade, tornamo-nos conduítes para distribuir a benevolência de Deus ao mundo. Isso está refletido no signo de Aquário, o distribuidor de água. O território de Aser, a tribo deste mês, produzia alimentos em abundância.

Peixes (Adar) Os peixes vivem nos recessos ocultos do mar. A Festa principal deste mês é Purim, que celebra a mão oculta de Deus na história. A letra deste mês, cuf (c), significa “macaco”. Reconhecemos que Deus está oculto ao fazermos máscaras em Purim, imitando (macaqueando) qualquer pessoa que quisermos. A celebração de Purim derruba as inibições que ocultam nossa essência interior. Normalmente, transformar o mal em santidade é um processo metódico. Entretanto, nossos Sábios ensinam que “o júbilo derruba todas as fronteiras”. Através do “riso correto”, atributo deste mês, transformamos obstáculos em oportunidades, um decreto para a destruição em um dia de celebração. Efetuamos esta transformação com a velocidade da tribo deste mês, Neftaly, o mais rápido dos filhos de Jacó.

O ZOHAR disse que o Povo de Israel ficou sob a influência dos astros até a outorga da Lei, no Monte Sinai, o que aconteceu no terceiro mês (Sivan) após a saída do Egito.

Deuteronômio (18, 13) exclui a possibilidade de se recorrer aos astrólogos ou orientar-se através de horóscopos. (Prof. Ismar Dias de Matos)

quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Deus cria - o homem transforma!


No princípio Elohim criou Céus e Terra, diz o primeiro livro da Bíblia (Gênesis/Bereshit, cap.1,1). No começo de tudo, ou na “cabeça” (Reshit) de tudo, uma coisa nova (Beri’a) brotou (Bará) do nada. O Criador é o grande Boréh, o único (Ehad) que pode criar sem o uso de matéria prima pré-existente.
Está, aqui, uma ideia judeu-cristã da não-eternidade do mundo: o mundo não é eterno; foi criado, como professam os católicos no Credo. Elohim-Deus é Palavra criadora. A palavra é o querer de Deus (Salmo 33,6). Jesus, o Unigênito do Pai, diz ao cego: “Eu quero, sê purificado” (Mt 8,3). “Como o Pai ressuscita os mortos e os faz viver, também o Filho dá a vida a quem quer” (João 5, 21).

O Evangelista João diz que “no princípio o Verbo era Elohim” (Jo 1,1-3) e que tudo foi feito por meio d`Ele e que nada foi criado sem Ele. A Palavra criadora do Gênesis – “e Elohim disse” – é a mesma do Segundo Testamento. São Paulo diz em Colossenses: “Porque n’Ele foram criadas todas as coisas” (1, 16). E o mesmo Apóstolo diz aos Romanos: “Porque tudo é d’Ele, por Ele e para Ele. A Ele a glória pelos séculos!”. (Rm 11,36).

Há no primeiro livro das Escrituras Sagradas quatro sentidos para o verbo CRIAR, sendo o primeiro (Gn 1,1) o de criar ex-nihilo, ou seja, a partir de nada; o segundo sentido (Gn 1,7) significa criar (Asa) a partir de alguma coisa; o terceiro significado de criar (Gn 2,7 = Yatsar) dá a ideia de modelar algo, como faz o oleiro; o quarto e último sentido de criar, em Gênesis (2,2), é Banáh, que dá a entender construir sobre.

Excetuando-se o primeiro significado, todos nós somos também criadores ou co-criadores, pois criamos a partir de uma matéria prima, modelamos, plastificamos a realidade como senhores, em mandato divino: “Crescei, enchei a terra e a submetei” (Gn 2, 28).

O Deus-Oleiro, do segundo capítulo de Gênesis (2,7), que modelou o homem a partir da argila do solo, pode nos dar a entender que a Criação pode ser concebida como algo em evolução; um ser inanimado, de barro, ganha, com o tempo, o Spiritus ou Sopro divino e se torna um ser vivente, evolui.

Os cientistas da atualidade, sobretudo os das ciências biológicas e da medicina, a partir de algumas células são capazes de reproduzir um órgão inteiro. Esses cientistas, no entanto, têm um grande sonho: construir a matéria orgânica, não simplesmente transformá-la. Com esse intuito, investem bilhões e bilhões de dólares e de euros em instrumentos como o Large Hadron Collider, LHC – o grande acelerador de partículas, de 27 km, localizado na fronteira franco-suíça.
Prof.Ismar Dias de Matos. E-mail: prof.ismar@terra.com.br

Nova missão e novo nome

Lemos na Bíblia, no livro dos Números (13, 16), que Moisés deu a Oséias, filho de Nun, o nome de Josué. Oséias, e outros onze homens, haviam sido escolhidos para explorar a terra de Canaã. Os doze escolhidos eram príncipes de suas tribos, e deveriam explorar a terra e trazer notícias ao Comandante e grande líder Moisés.

Por que Moisés mudou o nome de Oséias, filho de Nun, e príncipe da Tribo de Efraim? Iluminado pelo Eterno, Moisés queria garantir que Oséias não falhasse na missão de que estava encarregado, e acrescentou ao nome do jovem príncipe Oséias a primeira letra hebraica do nome do Eterno (a letra Yud). Com o acréscimo, “Oshea” ou “Oshua” transformou-se em Joshua, ou seja, Josué, que significa “Javé Salva”.

Josué havia sido transformado em novo homem, com a bênção do Eterno D’us. Somente ele e Caleb, filho de Jefoné, da Tribo de Judá, se mantiveram íntegros e não se abateram com as impressões da terra que estavam por possuir. Confira a história em Números 13, versículo 25 em diante.

A Bíblia nos dá outros exemplos de mudanças de nomes. Abrão transformou-se em Abraão (Gn 17,5); Jacó transformou-se em Israel (Gn 32, 29); Simão tornou-se Pedro (Mc 3, 16; Mt 16, 18; Jo 1, 42). Sempre que a missão muda, Deus muda o nome do missionário. Quando Mário Jorge Bergoglio deixou de ser apenas o cardeal-arcebispo de Buenos Aires e transformou-se no pontífice máximo da Igreja Católica, seu nome tornou-se Francisco. Nova missão, novo nome.

Prof. Ismar Dias de Matos.
E-mail: prof.ismar@terra.com.br

Via Sacra baseada n’O pequeno príncipe

I – Jesus é condenado à morte por Pilatos.
“Então, tu também vens do céu? De que planeta és tu?”

II – Jesus com a cruz às costas.
“Quando a gente anda sempre para a frente, não pode mesmo ir longe”.

III – Jesus cai pela primeira vez.
“Então, para que servem os espinhos?”

IV – Jesus se encontra com sua mãe.
“Se alguém ama uma flor, da qual só existe um exemplar em milhões e milhões de estrelas, isso basta para que seja feliz quando a contempla”.

V – Simão Cirineu ajuda a Jesus a carregar a cruz.
“Se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro”.

VI – Verônica enxuga o rosto de Jesus.
“É preciso buscar com o coração”.

VII – Jesus cai pela segunda vez.
“Espinho não serve para nada. Pura maldade das flores”.

VIII – Jesus consola as filhas de Jerusalém.
“É tão misterioso o país das lágrimas”.

IX – Jesus cai pela terceira vez.
“E, deitado na relva, ele chorou”.

X – Jesus é despido de suas vestes.
“É preciso proteger as lâmpadas com cuidado. Um sopro as pode apagar”.

XI – Jesus é pregado à cruz.
“Onde estão os homens?”

XII – Jesus morre na cruz.
“Quando a gente está triste demais, gosto do pôr do sol”.

XIII – Jesus é entregue à sua mãe.
“Se tu vens às quatro da tarde, desde às três eu começarei a ser feliz. Às quatro horas, estarei inquieta e agitada; descobrirei o preço da felicidade. Mas, se vens a qualquer momento, nunca saberei a hora de preparar o coração. É preciso ritos...”

XIV - Jesus é depositado no sepulcro
“Eu não posso carregar este corpo. É muito pesado... Mas será como uma velha casca abandonada. Uma casca de árvore não é triste...”

XV – A ressurreição de Jesus

“Será bonito, sabes? Eu também olharei as estrelas. Todas as estrelas serão poços com uma roldana enferrujada. Todas as estrelas me darão de beber... Tu terás quinhentos milhões de guizos, eu terei quinhentos milhões de fontes...”

(Autor desconhecido. Texto publicado por Dom Marcos Barbosa, OSB, no seu programa “Encontro marcado”, na Rádio Jornal do Brasil, em 31/07/1983. As duas últimas estações foram acrescentadas por Ismar Dias de Matos).

Algumas características da contemporaneidade

O tempo em que vivemos é pleno de incertezas. Não atingimos o terreno firme das sonhadas certezas do conhecimento moderno. Os palestrantes costumam dizer: “Não tenho receitas prontas; cada caso é um caso”.

Há um absoluto Relativismo reinando em todos os lugares. O que era absoluto passou a ser relativo; o relativo se tornou absoluto, sobretudo no campo ético. Aliás, muito se fala de ética e pouco se sabe dela.

A vida pode ser considerada como um bem frágil, fragilíssimo. Pessoas matam outras pessoas por causa de um celular ou menos do que isso; uma pessoa é assassinada porque tem dinheiro, e outra é morta porque não tem dinheiro. As formas privadas e públicas de segurança diminuem os crimes, mas não impedem que eles cessem.

Embora se fale de Relativismo, há espaço para muitos fanatismos e intolerâncias nas religiões, no futebol, na política. A contemporaneidade comete crimes de injúria racial e de racismo como as pessoas dos séculos passados. Pouca coisa mudou.
As coisas devem ter pouca durabilidade porque devem ser sempre trocadas por outras. É claro que há garantias de quatro, cinco ou mais anos para um aparelho de TV ou outro produto, mas dentro de cinco anos ele já terá sido trocado. Quem suporta uma TV de três anos, quando outros modelos já foram lançados no mercado? Só loucos usam um aparelho de celular por cinco anos.

As pessoas – homens e mulheres – fazem uma questão muito grande de se apresentarem bonitas. Salões de beleza estão por todos os lados. Clínicas de estética têm um crescimento surpreendente. Não faz muito tempo nasceu uma expressão para caracterizar os homens que valorizam a aparência mais do que o comum de seus pares: metrossexual. Poderíamos chamar essa grande valorização da visibilidade de neo-narcisismo?

Como são preenchidos os grandes vazios humanos, aqueles momentos de angústia, de insegurança, de medos tão diversos? Os medicamentos de tarja preta resolvem nossos problemas? As drogas lícitas e ilícitas estão sendo eficazes? Como encontrar a cura para as dores daquilo que o dinheiro não compra? O que fazer para viver melhor na contemporaneidade?
(Prof. Ismar Dias de Matos)

terça-feira, 5 de agosto de 2014

Transfiguração do Senhor

Dia 6 de agosto celebramos a festa da Transfiguração de Jesus, conforme relato de Mateus (17, 1-9). Diante de duas testemunhas do 1º Testamento – Moisés e Elias – Jesus mostra a três de seus apóstolos – Pedro, Tiago e João – a sua Face Gloriosa. A cena se dá no alto de um monte que Mateus não dá nome, e que pode ser o monte Hermon, próximo a Cesareia de Felipe; como pode ser também o monte Panium, nas proximidades do rio Jordão; como pode ser também o monte Tabor, no qual foi construída a Igreja da Transfiguração, muitíssimo visitada pelos turistas. O lugar físico não é o mais importante no episódio.
A cena da Transfiguração se dá pouco depois de Jesus haver perguntado aos discípulos “quem era Ele” na opinião do povo, ocasião em que Pedro, ao fim de tantas respostas, fez sua belíssima profissão de fé: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus Vivo” (Mt 16,16). Jesus, então, confirma Pedro como a pedra sobre a qual será construída a Sua Igreja.
Além da Transfiguração, testemunhada por Pedro, Tiago e João (2 Pd 1, 16), outros quatro grandes episódios marcam a história de Jesus: o Batismo, a Crucificação, a Ressurreição e a Ascensão. A Transfiguração une os dois Testamentos bíblicos: Moisés e Elias, representando a Lei e os Profetas, resumem o 1º Testamento; Pedro, Tiago e João – o grande trio dos Evangelhos – representam o 2º Testamento, que tem Jesus como o personagem central.
“Uma imagem fala mais que mil palavras”, diz uma afirmativa corrente. Por isso Jesus quis confirmar no íntimo de seus apóstolos uma imagem positiva de Sua glória futura, para que eles fossem testemunhas daquela maravilha e pudessem ser fortalecidos diante das provações pelas quais passariam.
Eu disse, acima, que o lugar da Transfiguração não é o mais importante, pois Jesus continua se transfigurando diante de nós, o tempo todo. Dizemos nas celebrações: “Ele está no meio de nós”. De fato, Ele está nos irmãos e irmãs necessitados (Mt 25, 31-46); está presente onde “dois ou mais se reúnem em Seu nome” (Mt 18,20).
É preciso ter olhos espirituais para ver o Senhor. Pedro, Tiago e João, com olhos espirituais, viram Moisés e Elias, há séculos já falecidos, ao lado de Jesus. É preciso aprender com eles.
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Ismar Dias de Matos, sacerdote católico, e professor de Filosofia e
Cultura Religiosa na PUC Minas. E-mail: p.ismar@pucminas.br

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

DIA INTERNACIONAL DA MULHER

Não dá pra falar só de flores!

No próximo dia 8 de março vamos comemorar o Dia Internacional da Mulher, definido pela Organização das Nações Unidas (ONU), desde 1977. A data lembra um massacre de mulheres, em Nova Iorque, em 1857. Naquela ocasião, cerca de 130 mulheres, todas elas tecelãs, reivindicavam melhores condições de trabalho, redução da carga horária de 16 para 10 horas diárias, equiparação de salário com os homens etc. Além de não serem atendidas, foram trancadas dentro da fábrica e ali morreram carbonizadas, vítimas de um incêndio criminoso. Triste memória.

O Dia Internacional da Mulher nos faz pensar, poeticamente, em flores, em carinho, em amor. Mas parece que não há um saldo positivo para comemorarmos nesse dia, pois sabemos que a violência contra as mulheres continua e destrói o pouco que há. Na Amazônia, por exemplo, vivem cerca de 800 mil pessoas na condição de traficadas. Grande parte dessas pessoas são mulheres, adolescentes e jovens, com idade entre 14 e 21 anos, e vivem uma escravidão sexual. O lugar possui tal característica porque ali a pobreza é tamanha e a “mão de obra” tem um baixo custo para os exploradores.

A região Amazônica, com seus milhares de quilômetros de fronteira, tornou-se, infelizmente, um imenso corredor que propicia o tráfico de pessoas. Muitas têm como destino a Europa, onde viverão como escravas sexuais, durante a noite, e, durante o dia, tendo que trabalhar na limpeza e na organização dos estabelecimentos em que trabalham e são mantidas praticamente em regime de cárcere, sempre devendo aos patrões e sem condições de saldar a dívida.

Segundo relatório da Anistia Internacional, o tráfico de pessoas é uma das formas ilegais mais lucrativas do mundo. Estima-se um movimento de 35 bilhões de dólares anuais. As mulheres traficadas entram no país de destino com visto de turista, e a ação da exploração sexual muitas vezes é camuflada nos registros por atividades legais como o agenciamento de modelos, babás, garçonetes ou dançarinas. Uma recente novela do horário nobre de nossa TV mostrou um pouco dessa realidade.

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB, ao eleger o tema – “Fraternidade e Tráfico Humano” como assunto da Campanha da Fraternidade-2014, compromete-se também em colocar toda a sua estrutura organizacional em prol de estudos e formulação de propostas para o Brasil avançar nacionalmente nas ações de enfrentamento ao tráfico de pessoas e da exploração sexual de crianças, adolescentes e jovens.

Concluo o meu texto evocando a figura de uma grande mulher: Maria da Penha Maia Fernandes, cearense corajosa, vítima de maus tratos do marido Marco Antônio, que a deixou paraplégica após desferir um tiro em suas costas. Maria da Penha lutou por mais de quinze anos para que a legislação brasileira fizesse uma lei especial que levasse em conta a violência contra a mulher. Foi criada, então, a lei 11.340, que entrou em vigor no dia 22/09/2006, e que leva o nome de “Lei Maria da Penha”.

Muito sangue, muita luta ainda está por vir, até que possamos dizer que “é para a liberdade que Cristo nos libertou”(Gl 5,1). As incontáveis vidas ceifadas até agora não podem ter sido em vão! Queremos poder, sim, nesse Dia Internacional da Mulher, falar de flores, de carinho, de amor, de liberdade. Chega de correntes, de dor, de desamor.

Ismar Dias de Matos, professor de Filosofia e Cultura Religiosa na PUC Minas.
E-mail: p.ismar@pucminas.br

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

INTENDENTE CÂMARA E MORRO DO PILAR

INTENDENTE CÂMARA

Intendente Câmara é o nome da usina da USIMINAS, em Ipatinga, em Minas Gerais. Poucos, na verdade, sabem quem foi o Intendente Câmara, cujo nome era Manuel Ferreira da Câmara Bittencourt Aguiar e Sá, filho de Bernardino Rodrigues Cardoso e Francisca Antonia Xavier de Bitencourt e Sá. Sabe-se que nasceu em Minas Gerais, em 1762, e faleceu na Bahia, 13 de dezembro de 1835.

Estudou Direito e Filosofia, na Universidade de Coimbra, e Mineralogia, na Universidade de Freyberg. Foi engenheiro e político: Intendente dos Diamantes, em Diamantina (até 1822), e Intendente-geral das Minas, senador do Império, de 1827 a 1835. Era Dignitário Honorário da Ordem Imperial do Cruzeiro e Comendador da Ordem de Cristo.


TRABALHOS PUBLICADOS PELO INTENDENTE CÂMARA:

1.Observações feitas por ordem da Real Academia de Lisboa acerca do carvão-de-pedra da Freguesia da Carvoeira. Setembro, 1798.

2.Ensaio de descrição física e econômica da Comarca de Ilhéus, na América - Lisboa, 1789.

3.Dissertação sobre plantas do Brasil que podem dar linho. Lisboa, 1810.

4.Memória mineralógica do terreno mineiro da Comarca de Sabará - MG, oferecido ao Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.

5.Memória de observações físico-econômicas acerca da extração do ouro das minas do Brasil (Inéditas).

6.Tratado de mineração no Brasil (Inédita, em poder da Família do Autor).

7.Memória sobre as minas de chumbo e prata e sobre fundição de ferro por meio de diminuta porção de combustível e por um novo processo (sabe-se apenas que foi escrita em Francês e publicada na Alemanha).

8.Resposta dada à Câmara da cidade da Bahia, à qual consultou Manuel Ferreira Câmara, sobre diferentes quesitos que lhe foram feitos por parte do governador em conseqüência da ordem que para isso tivera de Sua Alteza Real no ano de 1807 (Ministério das Relações Exteriores).

9.Sociedade de agricultura, comércio e indústria da província da Bahia.

10.Primeira sessão a 10 de março de 1832. Discursos do Presidente Manuel Ferreira da Câmara Bittencourt Aguiar e Sá e do Secretário, etc.

MORRO DO PILAR

Morro do Pilar, antes de ser o nome de um clube social, em Ipatinga, é o nome de uma cidade localizada na Serra do Espinhaço, no conjunto que forma a Serra do Cipó, distando 164 km de Belo Horizonte. Possui uma população urbana de 2.228 habitantes, e uma população rural 1.645 habitantes, que ocupam uma área de 421 km2.

Na cidade, dentro da área urbana, no Bairro Paredão, há um monumento construído para homenagear o Intendente Câmara, responsável pela Instalação da Real Fábrica de Ferro de Morro do Pilar, ou Fábrica do Rei, que foi a primeira do Brasil a fabricar ferro líquido em alto forno. Em estilo moderno executado em 1990, o monumento abriga as ruínas da primeira fábrica de ferro da América do Sul.

Morro do Pilar foi um grande centro de mineração. Existem indícios de atividades em 1701, conforme a tradição. Formada a povoação, em função da exploração do ouro, erigiu-se a primitiva capela sob a invocação de Nossa Senhora do Pilar, mais tarde substituída por um segundo templo que recebeu a benção por provisão em 1789.

O arraial primitivo foi transferido para um plano mais baixo da colina, situando-se nos contrafortes da serra do Espinhaço. A mineração do ouro, fator de origem e desenvolvimento do arraial, já estaria praticamente abandonada em princípios do século XIX, não mais prevalecendo como exploração regular de significado econômico, conforme Valmar Coelho.

Em 1809, o Intendente dos diamantes, Manuel Ferreira da Câmara Bitencourt Aguiar e Sá, deu início a primeira fábrica de ferro do Brasil - a Real Fábrica de Ferro - e que 1814 consegue fabricar ferro líquido. A pioneira fábrica funcionou, em regime de produção mais ou menos regular, de 1814 a cerca de 1830, época em que encerrou suas atividades, de acordo com Carneiro de Mendonça em seu livro "O Intendente Câmara".

As remanescentes ruínas da Real Fábrica de Ferro ainda documentam de modo expressivo o passado arrojado de industrialização. Esta iniciativa marcaria o empreendimento siderúrgico em terras mineiras, e teria apenas em 1921, com a fundação da Cia. Siderúrgica Belgo Mineira, a sua maior expressão.

Morro do Pilar, nos dias atuais, ocupa-se da produção de cana-de-açúcar, laranja, banana, mandioca e milho, pecuária, além de indústria de transformação e mineração.

Autor: Ismar Dias de Matos, professor de Filosofia e Cultura Religiosa na PUC Minas, Associado Efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais, cadeia 75.
E-mail: p.ismar@pucminas.br

BIBLIOGRAFIA

ÁVILLA, Affonso, GONTIJO, João Marcos Machado, MACHADO, Reinaldo Guedes. Barroco Mineiro - Glossário de arquitetura e ornamentação. Rio de Janeiro: Fundação João Pinheiro/Fundação Roberto Marinho, 1979.

MENDONÇA, Marcos Carneiro de. O Intendente Câmara. São Paulo: Nacional, 1958.

SITES CONSULTADOS EM 30 DE JUNHO DE 2007:

www.vtn.com.br/cidades/cidadeshistoricasminas/diamantina/diamantina.htm

www.tratosculturais.com.br/diamantina/UniVlerCidades/Cidades/morro_do_pilar/area.htm

www.estradareal.org.br/cidad/onde_ir/index.asp?codigo=36&tipo=4%7CCULTURAL&x=36&y=6
http://www.senado.gov.br/sf/senadores/senadores_biografia.asp?codparl=2094&li=3&lcab=1834-1837&lf=3

http://pt.wikipedia.org/wiki/Manuel_Ferreira_da_C%C3%A2mara_Bittencourt_Aguiar_e_S%C3%A1

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

BRAZUCA E FULECO ... ORA, BOLAS!

Os torcedores brasileiros escolheram o nome da bola que vai ser usada nos jogos da Copa Mundial de Futebol deste ano 2014, no Brasil, que vai começar no Dia dos Namorados. Dentre os nomes propostos pela FIFA, o escolhido foi Brazuca (77,8% dos votantes), que disseram significar “emoção”, “orgulho” e “boa vontade”. A grafia certa, em Português, seria com “s”, mas para dar um caráter internacional (padrão FIFA), coloca-se o “z” de Brazil, in English.

Quem se lembra do nome da bola da última Copa, na África do Sul? Jabulani, que numa das onze línguas sul-africanas significa “celebrar”. A bola da Copa Alemã (2006) chamou-se Teamgeist, cujo significado é “espírito de equipe”. Jabulani e Teamgeist são nomes bonitos, positivos. Não gostei de Brazuca. Mas isso não tem importância nenhuma.

O professor Pasquale Cipro Neto (Folha de S. Paulo, 13/09/2012, p. C2) também não gostou do nome Brazuca, pois é um termo pejorativo: “Brazuca está para ‘brasileiro’ assim como Portuga está para ‘português’”. E o professor lembra também que o sufixo “uca” está bastante ligado a algo negativo, como, por exemplo, mixuruca, muvuca, maluca,caduca, butuca.

Os brasileiros que moram fora do Brasil são chamados de Brazucas, termo que teria sido inventado por portugueses, em retaliação a Portuga. Nos Estados Unidos, os latino-americanos somos chamados de Cucarachos, ou seja, “baratas”. Oxalá o nome Brazuca ganhe nova semantização e passe a significar, com a magia do futebol, algo positivo.

Também ambientalistas acham positiva a escolha do tatu-bola (Tolypeutes tricinctus) como mascote da Copa, pois pode ser uma oportunidade de divulgar informações sobre essa espécie genuinamente brasileira e alertar para o sério risco de sua extinção. Mas o bichinho ganhou o nome de FULECO. Isso não parece nada engrandecedor para a fauna brasileira! Poderia, simplesmente, ser TATU, pois lembraria o som inglês de Tatoo.

A relação desse tatu com o futebol é o formato de bola que ele adquire ao se defender de predadores. Ao perceber a presença de onças, raposas ou cães, seu corpo se contorce e o animal esconde partes frágeis como o tronco, a cabeça e as patas no interior de uma dura carapaça – que se fecha e fica em formato de bola. Mas, agora, chamar esse pequeno herói de Fuleco, ai meu Deus!

Ismar Dias de Matos, professor de Filosofia e Cultura Religiosa na PUC Minas. E-mail: p.ismar@pucminas.br


sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

“Quem me vê, vê o Pai.”

O evangelho nos diz que o apóstolo Felipe, ao ouvir Jesus falar sempre do Pai, quis que Esse lhe fosse apresentado: “Mostra-nos o Pai, e isto nos basta”. Mas Jesus lhe respondeu: “Quem me vê, vê o Pai (Jo 14, 6-9). Mais tarde São Paulo escreveu que Jesus “é a imagem visível do Deus invisível” (Cl 1, 15), e n’Ele “habita corporalmente toda a plenitude da Divindade” (Cl 2,9).

Podemos imaginar que Felipe tenha ficado, a princípio, um pouco desapontado. Como é possível olhar para Jesus, o Filho, e ver n’Ele o Pai? O que nos possibilita essa visão? O Eterno é imaterial e invisível. Puro Espírito. Ou seja, “por trás” de Jesus não há nada visível, pois Ele é a única imagem sensível do conceito abstrato da Divindade, como disse o Apóstolo. Jesus, ao encarnar-se, assumiu a nossa humanidade, fez-se homem, nasceu de Maria pelo poder do Espírito Santo. Mas o que na verdade importa não é a figura humana de Jesus que alguém tem diante de si, mas sim a mediação do Espírito Santo que faz com que a pessoa possa ver no Filho o Deus Invisível, a Divindade abstrata e universal. Em outras palavras: o conceito de Pai é preenchido pela mediação de um esquema a priori que nos faz ver a realidade sensível de um homem e identificá-la com o conceito de divindade eterna presente em nosso ser.

Ismar Dias de Matos, sacerdote diocesano, professor de filosofia e cultura religiosa na PUC MINAS: p.ismar@pucminas.br

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS SILOGISMOS

1.Os modos do silogismo

Os escolásticos inventaram um sistema mnemônico para designar os modos válidos dos silogismos (do grego, ΣΙΛΛΟΓΙΣΜΟΣ, σιλλογισμοσ, que significa: cálculo composto). A palavra já era empregada por Platão para raciocínio em geral (cf. Teeteto, 186 d) e foi adotada por Aristóteles para indicar o tipo perfeito do raciocínio dedutivo, definido como “um discurso em que, postas algumas coisas, outras derivam necessariamente” (An. Pr., I, 1, 24 b, 18...).

Os escolásticos tiraram das palavras AffIrmo e nEgO os símbolos A-E-I-O para sinalizar as premissas ou proposições: A: afirmativa universal; E: negativa universal; I: afirmativa particular: O: negativa particular.

Asserit A, negat E, verum generaliter ambo;
Asserit I, negat O, sed particulariter ambo.

Por volta de 1250, os escolásticos difundiram os versos Bárbara, Celarent, etc, que já se encontravam nas Summulae de Guilherme de Shyreswood e de Pedro Hispano. As palavras não têm nenhum sentido, isto é, não formam proposições nem períodos. BOCHENSKI (cf. Formale logik, p. 248, verbete silogismo: Citado por CAROSI, Paulo. Curso de filosofia, 2 . ed, .v. I, São Paulo: Paulinas, 1969, p. 353.) afirma que Jorge Scholarios traduziu-os para o grego com palavras que têm sentido.

Note-se que todas as palavras são formadas pelas quatro primeiras consoantes B-C-D-F ; as vogais indicam a quantidade (geral ou particular) e a qualidade (afirmativa ou negativa) das premissas.

1ª figura: Barbara, Celarent, Darii, Ferio;
2ª figura: Cesare, Camestres, Festino, Baroco;
3ª figura: Darapti, Felapton, Disamis, Datisi, Bocardo, Ferison;
4ª figura: Bamalip, Calemes, Dimatis, Fesapo, Fresison.

2. As quatro figuras (ou modelos) silogísticas.
Os termos do silogismo são três: M: termo médio, T: termo maior; e t: termo menor. Verificar a posição do termo médio em cada uma delas, abaixo.

1ª Figura - Termo Médio é sujeito na premissa maior, e predicado na menor.
M – T
t – M
t - T

2ª Figura - Termo Médio é predicado na premissa maior e na menor.
T – M
t – M
t - T

3ª Figura - Termo Médio é sujeito tanto na premissa maior quanto na menor.
M – T
M – t
t - T

4ª Figura - Termo Médio é predicado na premissa menor, e sujeito na maior.
T - M
M – t
t - T

• A primeira premissa chama-se também “premissa maior” ou simplesmente “maior”;
• A segunda premissa chama-se também “premissa menor” ou simplesmente “menor”
• Note-se que na conclusão a posição dos termos menor e maior é sempre a mesma nas 4
figuras ou modelos.
• Os modelos (ou figuras) 1 e 4 são invertidos; idem para os modelos 2 e 3.

3. As oito leis do silogismo (em português e latim)

1. Só podem existir três termos no silogismo: t – T – M;
Terminus esto triplex: medius maiorque minorque.

2. Na conclusão, o t e T não podem ser mais extensos do que nas premissas
Latius hos quam praemissae conclusio non vult.

3. O termo médio (M) não pode entrar na conclusão;
Nequaquam médium capiat conclusio oportet.

4. Ao menos uma vez o M deve ser universal;
Aut semel aut iterum medius generaliter esto.

5. Se ambas as premissas são afirmativas, a conclusão também será afirmativa;
Ambae afirmantes nequeunt generare negantem.

6. De premissas negativas nada se conclui;
Utraque si praemissa neget nihil inde sequetur.

7. A conclusão segue sempre a parte mais frágil, a pior parte;
Peiorem sequitur semper conclusio partem.

8. As premissas não podem sem ambas particulares.
Nil sequitur geminis ex particularibus nunquam.

4. Regras para cada figura:

• 1ª figura ou 1º modelo: A maior deve ser sempre universal.
• 2ª figura ou 2º modelo: Uma das premissas deve ser negativa; a maior deve ser universal.
• 3ª figura ou 3º modelo: A menor deve ser afirmativa; a conclusão deve ser particular.
• 4ª figura ou 4º modelo: Se a maior é afirmativa, a menor deve ser universal; se a menor é afirmativa, a conclusão deve ser particular; se uma das premissas é negativa, a maior deve ser universal.


5. Exercícios de fixação do aprendizado


Questão 01: Examine os silogismos abaixo e escreva a qual figura pertence cada um:

1) O estudo da Lógica é atraente. Figura nº ....................
Ora, todo o estudo da Lógica é bom para a vida.
Logo, o que é bom para a vida é atraente.

2) Nenhum ponto da Lógica é dispensável. Figura nº ..................
Ora, toda coisa ruim é dispensável.
Logo, nenhuma coisa ruim é ponto da Lógica.

3) Nenhum estudante de Lógica é desatento. Figura nº ..................
Ora, algum desconfiado é estudante de Lógica.
Logo, algum desconfiado não é desatento.

4) O estudo da Lógica é importante. Figura nº:...................
Ora, Tudo o que é importante é necessário.
Logo, é necessário o estudo da Lógica.

Questão 02: Assinale, abaixo, a alternativa correta que corresponda à sequência das palavras das figuras de cada silogismo da questão anterior:

a) FERIO – BARBARA – CALEMES – DARII
b) DIMATIS – CESARE – FERIO – DISAMIS
c) DISAMIS – CESARE – FERIO – DIMATIS
d) DISAMIS – FESTINO – BOCARDO – CALEMES
e) CESARE – DISAMIS – FERIO – DIMATIS

Questão 03: Formar 01 (um) silogismo para cada figura em que apareçam as seguintes condições:
a) Para o silogismo da 1ª Figura: a conclusão deve ser afirmativa particular.
b) Para o silogismo da 2ª Figura: a maior deve ser negativa universal.
c) Para o silogismo da 3ª Figura: a menor deve ser afirmativa.
d) Para o silogismo da 4ª Figura: apenas a menor seja afirmativa.

Questão 04 Qual (is) é (são) a (s) figura (s) silogística (s) em que a premissa menor é sempre afirmativa? Quais são as palavras que a ela (s) correspondem?

6. Exemplos de silogismos falsos (brincadeiras)
Obs: Estes silogismos não seguem as leis da Lógica (cf. nº 3, acima)

Deus ajuda quem cedo madruga.
Quem cedo madruga dorme à tarde
Quem dorme à tarde não dorme à noite
Quem não dorme à noite sai na balada
Logo, Deus ajuda quem sai na balada.

Deus é amor.
O amor é cego.
Steve Wonder é cego.
Logo, S. Wonder é Deus.

Disseram-me que não sou ninguém
Ninguém é perfeito
Mas só Deus é perfeito
Logo, eu sou Deus
Logo, eu sou perfeito

Se Steve Wonder é Deus, eu sou Steve Wonder
Meu Deus, eu sou cego

Imagine um pedaço de queijo suíço, daqueles bem cheios de buracos. Quanto mais queijo, mais buracos. Cada buraco ocupa o lugar em que haveria queijo. Assim, quanto mais buraco, menos queijo. Quanto mais queijos mais buracos, e quanto mais buracos, menos queijos. Logo, quanto mais queijo, menos queijo.

Já sei...já sei

O Imperador Dom Pedro II, conforme testemunha dos que o conheceram de perto, tinha um cacoete. Quando lhe anunciavam qualquer novidade, atalhava logo “Já sei... já sei”. Tal cacoete deu motivo de muitas irreverências, como a que segue abaixo, publicada no jornal Gazeta da Tarde (MAGALHÃES JR., Raimundo. O império em chinelos. Edição ilustrada, Editora Civilização Brasileira, São Paulo: 1957, p. 90).

Já sei, já sei! Sabe tudo
o sábio por excelência!
Sabe mais do que a Ciência
e muito mais do que a lei.
Do passado e do presente
fez um estudo profundo,
sabe o futuro do mundo...
Já sei... já sei.


Matemática, Direito,
Escultura, Geografia,
mistérios da Astronomia,
Tudo sabe o nosso Rei!
Conhece o desconhecido!
Sabe tudo e ensina!
É forte na medicina...
Já sei... já sei.


Espiritismo, Comtismo,
África, América, Europa,
o fardamento da tropa...
Túnis, Marrocos... o bey...
Segredos dos alquimistas,
conhecimentos ignotos,
origem dos terremotos...
Já sei... já sei.


Sabe náutica e poesia,
advinha os alfarrábios!
(Silêncio, Mundo, aprendei!)
Catadupas de ciência
em borbotões fumegantes
vão caindo retumbantes...
Já sei... já sei.


O Padre Eterno, invejoso
de uma tal ciência infusa,
Lhe disse, a juízo de escusa,
- Dom Pedro, me sucedei,
Eu vos darei o Universo!
Mas o sábio firme, teso,
respondeu-Lhe com desprezo:
Já sei... já sei.

Sabe a cobrança de impostos,
o movimento das vagas,
o carnaval e as bisnagas...
Tudo sabe o nosso Rei!
Sabe manter os escravos...
É mesmo um sábio... E ignora
o Rumo de barra a fora.
Já sei... já sei.

O regato e o ipê

Autor: Padre Celso de Carvalho (foto),
poeta curvelano-diamantinense (1913-2000).

Ia o regato rolando
ao sol, o dia inteirinho.
E já bem tarde era, quando
viu um ipê no caminho.

No ipê sorria, tão linda
a densa fronde, e tão flava,
que, ao vê-la, de longe ainda,
já o regato sonhava.

Que doce enlevo seria
sentir nas águas cansadas
aquela imagem macia,
desfeita em sombras douradas!

Lentamente sobre a face
da terra a noite desceu,
e antes que ao ipê chegasse
o regato adormeceu.

Tudo silêncio. Nem voo
nem pio de ave no mato.
Que sonhos bons não sonhou
aquela noite o regato!

Mal mal a aurora o desperta,
olha adiante. Mas vê
somente a estrada deserta:
Ficou lá longe o ipê.

A água passou distraída,
os sonhos seus malograram...
E às margens de nossa vida
quantos ipês não ficaram!

Três sentidos de perdão

A palavra PERDÃO aparece centenas de vezes na Bíblia. Vemos, no 1º Testamento, pelo menos três sentidos diferentes de perdão:

1.Saláh: lavar, aspergir = Lev 4,26; 5,10, 1 Rs 8,30; Jer 31, 34. Salmo 51 (50); Lava-me da minha injustiça e purifica-me do meu pecado. Purifica-me com o hissopo e ficarei mais branco do que a neve;
2.Nasáh: levantar, carregar, retirar o pecado; desatar as cordas do jugo = Ex 32, 32 ; Salmo 25, 18; 32,1. No sacramento, o sacerdote nos Ab-solve, nos solta, nos liberta (das amarras, do peso, do jugo do pecado);
3.Kápar / (kipper): fazer expiação, destruir, reconciliação, purificar, voltar-se para (Deus) = Is 6,7 Yom Kippur é a festa judaica do perdão, da reconciliação, e é preparada com uma festa de dez dias.

No pedido do Pai Nosso, “perdoai as nossas dívidas, assim como perdoamos os nossos devedores” (Mt 6, 12), a palavra grega dá a ideia de remissão, de um “cancelamento de minhas dívidas”.

A etimologia de PERDÃO é PER-DONUM: o dom elevado ao seu grau extremo, além do jurídico, ou seja mais que sete vezes; infinitamente. “PER”, em latim, é prefixo de intensidade e nos dá a ideia de algo feito de modo extremo e completo. Exemplos: per-manente, per-pétuo, per-feito etc.

O “perdão” não nasce da racionalidade. Perdão é o desejo de reconciliação, de voltar-se para o próximo e para Deus. Podemos dizer que Deus perdoa depois que nós perdoamos?

Perdoar não é esquecer, mas a lembrança da ofensa, depois do perdão, é indolor, como uma cicatriz é indolor. Há a lembrança da lesão, mas não há mais dor.

Pe. Ismar Dias de Matos, professor de Filosofia e Cultura Religiosa na PUC Minas.

Padre Lima Vaz e a legitimidade de um pensar cristão

Agradeço-lhes, na pessoa do Padre Jamir Pedro Sobrinho, a gentileza pela escolha de meu nome para participar da VIII Semana Temática Filosófica do Seminário Diocesano Nossa Senhora do Rosário, de Caratinga. Aqui iniciei, em 1994, meus primeiros voos como professor de Filosofia, a convite do saudoso Mons. Levy de Paula Figueira (+04/02/2010), a quem dedico estas palavras, non solum in memoriam sed et in laudem.

É uma alegria estar aqui neste Seminário, lugar onde são cultivadas, durante anos, sementes do LÓGOS. Aqui, uma única e mesma semente é jogada no solo dos corações destes jovens que cursam Filosofia e Teologia. São dois cotilédones de uma semente única, bipartida: o logos philosophicus e o logos theologicus, que, saídos do chão, apontam para um mesmo horizonte, como se se tratasse do modelo ideonômico de Platão: o logos philosophicus – o que escolhi como objeto de trabalho – é aquele que realiza a tarefa anabática, isto é, faz a penosa experiência da subida de nossa razão ao Transcendente; e o logos theologicus – o que orienta o mais profundo do meu existir – realiza o movimento inverso, katabático, do Transcendente em direção à razão finita do homem. Ambos são, portanto, partes distintas (mas não separadas) de um único LOGOS SPÉRMATOS Transcendente que nos fascina e nos deixa maravilhados.

Com a audácia de um sonhador, iniciei aqui o magistério, visitei outros ares e lugares, e hoje aqui retorno com mais coragem que perícia, com mais projetos que realizações, mas sem medo de sucumbir nesta tentativa de voo, pois além da audácia dos que não conhecem o perigo tenho a meu lado companheiros e amigos, como, por exemplo, o Prof. Maurício Cruz. Direi aqui umas poucas palavras, umas ideias simples, portadoras do desejo único de apresentar uma foto 3X4 de um filósofo brasileiro e apontar caminhos para uma futura pesquisa sobre esse autor escolhido e querido – Padre Henrique Cláudio de Lima Vaz, SJ, ou talvez – ousadia minha, sonho meu – provocar um estímulo para a leitura dos textos desse filósofo profundo e tão pouco conhecido entre nossos professores. A simplicidade aqui mencionada, sem falsa modéstia, deve-se à falta de engenho e arte do palestrante.

Quando me deparei com o tema desta Semana Filosófica – “O pensamento filosófico cristão no século XX – um tema de atualidade permanente e de atualidade conjuntural – não pude deixar de pensar no entrelaçamento entre FÉ e RAZÃO que acontece na estrutura simbólica de nossa civilização há quase vinte séculos, desde as primeiras gerações de cristãos.

Se hoje falamos em pensamento filosófico cristão é porque uma plêiade enorme de homens vieram antes de nós. Pensemos nos Padres da Igreja, e nos filósofos como Plotino, Agostinho de Hipona, Boécio, Anselmo de Aosta, Tomás de Aquino, para citar apenas as estrelas de primeira grandeza.

Nossa cultura vive, há pelo menos quatro séculos – desde o século XVII – uma viva acerbação da luta da “Ilustração contra a superstição”, da “Luz contra as trevas”, uma polaridade de tensão entre Razão e Fé, fazendo com que dois grandes pontífices – Leão XIII e João Paulo II – produzissem dois textos magistrais que merecem uma atenta reflexão de nossa parte: Aeterni Patris (04-08-1879) e Fides et Ratio (14-09-1998). São os dois maiores textos balizadores do pensamento filosófico cristão.

(Voltarei a falar sobre a polaridade da tensão entre Razão e Fé no final desta palestra).

Creio que o tema de minha palestra – Padre Lima Vaz e a legitimidade de um pensar cristão – se insere perfeitamente no tema central das reflexões dessa VIII Semana – "O pensamento filosófico cristão no século XX" – e tem como justificativa as palavras do próprio Padre Vaz em seu último livro, Raízes da modernidade: em seu texto, ele afirmou situar-se no prolongamento de uma tradição filosófica que reivindica a legitimidade de um pensar especificamente cristão. E ele nos faz uma pergunta provocadora: “pode o estudioso que se professa cristão permanecer dentro desse universo da tradição filosófica ou deve, por honestidade intelectual, emigrar para o campo do fideísmo dogmático, de uma praxeologia voluntarista, da evasão mística ou, simplesmente do sentimento religioso puramente subjetivo?” (Henrique Cláudio de Lima Vaz, Escritos de filosofia VII: Raízes da modernidade, São Paulo: Loyola, 2002, p. 7).

Antes de buscar respostas, permitam que eu lhes fale rapidamente sobre esse filósofo brasileiro, mineiro de Ouro Preto, que nasceu em 24 de agosto de 1921. Estudou no Colégio Arnaldo, de Belo Horizonte, e ingressando na Companhia de Jesus, cursou Filosofia em Nova Friburgo, RJ, e fez Teologia na Pontifícia Universidade Gregoriana, de Roma. Foi ordenado sacerdote em 15 de julho de 1948. Obteve o doutorado em Filosofia, em Roma, com uma tese sobre a dialética e a intuição nos diálogos platônicos da maturidade. Autor de vasta obra filosófica, Padre Vaz exerceu o magistério por quase 50 anos.

De inteligência privilegiada e de excelente preparação filosófica, Padre Vaz possui uma obra que aborda todos os principais campos do saber humano. Seus Escritos de Filosofia, em seis volumes, juntamente com os dois volumes da Antropologia Filosófica, trazem em torno de 5.600 notas bibliográficas, que não são apenas referências bibliográficas, mas preciosos comentários que demonstram conhecimento detalhado da obra referenciada (Carlos Drawin, Padre Vaz: um mestre incomparável, in: MAC DOWELL, João A. Saber filosófico e transcendência. São Paulo: Loyola, 2002, p. 378).

Esse homem singular uniu inteligência e cultura ao desejo de ajudar os alunos a descobrir o fascínio da verdade e o método rigoroso do trabalho intelectual. Orientador da Juventude Estudantil Católica (JEC), da Juventude Universitária Católica (JUC), o sábio jesuíta marcou profundamente a vida de muitos jovens durante os chamados “anos de chumbo” da ditadura militar no Brasil, nos anos 60 do século passado. Padre Vaz atuou ininterruptamente no magistério filosófico universitário, seja na Faculdade de Filosofia da Companhia de Jesus, em Nova Friburgo (1953–1963), Rio de Janeiro (1975–1981) e Belo Horizonte (1982-2001), seja nos cursos de graduação, mestrado e doutorado do Departamento de Filosofia da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais (1964-1986), da qual recebeu em 2001, o título de Professor Emérito. Faleceu em 23 de maio de 2002.

Vários estudiosos já abordaram o pensamento vazeano em livros e inúmeros artigos. Para citar apenas alguns:
•SANTOS, Pedro Paulo Cristóvão dos. Ética e história, BH, UFMG, 1965;
•GAMBIN, Pedro. História e absoluto no pensamento de H.C de Lima Vaz, Porto Alegre: PUC, 1982 (mestrado);
•SCHMIDT, João Pedro. Teoria e práxis no pensamento de H.C de Lima Vaz. Porto Alegre, UFRGS, 1988 (mestrado).
•CRUZ, Pedro Cunha. O homem e a transcendência no pensamento de H.C de Lima Vaz. Roma. Pontificia Universitá di Santa Croce, 1995 (mestrado).
•SAMPAIO, Rubens Godoy Sampaio. A ontologia da intersubjetividade em Henrique Cláudio de Lima Vaz, Belo Horizonte: UFMG, 1999, (mestrado), trabalho editado com o título “O ser e os outros: um estudo de teoria da intersubjetividade”, São Paulo: Unimarco, 2001.
•SAMPAIO, Rubens Godoy. Metafísica e modernidade: método e estrutura, temas e sistema em Henrique Cláudio de Lima Vaz. Tese doutoral, publicada pela Loyola (São Paulo, 2006):

Cinco são os temas que atravessam os escritos de Lima Vaz: o mundo, o sujeito, a história, a cultura e a transcendência. Estão integrados em um sistema, e são atravessados pela perspectiva da metafísica do existir e pela perspectiva da compreensão genética da modernidade.

O primeiro momento de articulação sistemática desses temas se dá na Antropologia filosófica, na qual foram organizados a partir de uma perspectiva antropológico-personalista que repousa sobre a ideia da unidade da Razão. (SAMPAIO, Rubens. O ser e os outros, p. 11-15).

O tema do mundo obedece a quatro enfoques aprofundados na reflexão sobre a categoria da objetividade: o mundo como “physis” na racionalidade clássica; o mundo como natureza científica na racionalidade empírico-formal; o mundo compreendido a partir da racionalidade fenomenológica, e o mundo dos objetos da racionalidade técnica.

O tema do sujeito, segundo Lima Vaz, já está subjacente ao pensamento de Platão, quando este coloca o problema da natureza da ciência; ao pensamento de Aristóteles, quando este argumenta com o cético na base do princípio de não-contradição; e no pensamento de Tomás de Aquino, quando este fala da reflexão inspirada em Agostinho.

Na filosofia moderna, o problema do sujeito surge com o “eu penso”, cartesiano, e com o “Eu transcendental”, de Kant . Contudo, a noção de sujeito que se apresentou a Lima Vaz como a mais problemática, mais questionante e mais original foi a noção hegeliana de sujeito como conceito, como “Espírito Infinito”, que é atividade, é processo, movimento. E Lima Vaz, a partir da Lógica, de Hegel, pensará o sujeito como expressividade, como se pode comprovar na Antropologia filosófica, nos seus dois volumes.

O tema da história foi tratado através da noção de consciência histórica, que aos poucos foi sendo substituída pelo problema da inteligibilidade histórica, pois a consciência histórica supõe que a história seja inteligível e compreensível pelo sujeito para que ele possa alcançar a consciência histórica. A cultura, obra humana por excelência, é tema presente em toda a obra de Lima Vaz. O tema se desdobra nos temas da intersubjetividade e do ethos. Lima Vaz afirma que não há possibilidade de se pensar uma comunidade humana (lugar do nós) sem pensar juntamente a questão do ethos, patrimônio universal no qual se espelham todos os nossos atos singulares, ganhando sentido positivo ou negativo.

Todos os quatro temas aqui assinalados – o mundo, o sujeito, a história, a cultura – apontam para o quinto tema, a transcendência, apresentado como o fundamento dos discursos sobre o mundo, o sujeito, a história e o sentido da história, bem como o fundamento da comunidade ética e, portanto, do ethos. A transcendência apresenta-se como uma consequência natural de sentido para a história, para o mundo, para a cultura, pois cada uma dessas dimensões é um contínuo desdobrar da expressividade do homem. Ao lado e além da abertura do humano para sua alteridade, há a abertura para o Totalmente Outro, o Absoluto, aquele que dá sentido teleológico ao constante ultrapassar que o homem faz diuturnamente.

Voltando à indagação de Lima Vaz sobre a legitimidade de um pensar cristão, poderíamos fazer uma outra indagação: seria mesmo legítimo e oportuno, além das paredes deste Instituto, falar de um “pensar cristão” após o interdito imposto por Kant sobre o tema da transcendência? Seria essa tarefa possível e legítima após a imensa produção de Feuerbach, Marx, Nietzsche, Freud e outros chamados filósofos da suspeita? Assim indago porque o pensar cristão nos remete à categoria do Absoluto e este parece estar reduzido hoje a uma disjuntiva simples: ou o Absoluto existe como Ser-em-Si, como Aquele que É, isto é, como Ens a Se e como Criador e, então, o homem é nada; ou o homem é artífice real de si mesmo e do seu mundo, e o Absoluto transcendental é uma quimera a ser exorcizada.

Uma das causas da mencionada disjuntiva parece ser o abandono da Metafísica e, com ela, o surgimento de uma ideia da Razão que deu lugar à noção de que tudo é construído pelo homem e de que não há princípio algum fundante ao qual o homem se refira. Na origem desse paradoxo pode-se notar o abandono de um Absoluto trans-mundano e trans-histórico que guiou o homem ocidental na descoberta de si mesmo na sua auto-afirmação como pessoa-inteligência e liberdade.

Muitos daqueles que são chamados a dar respostas, na impossibilidade de enfrentar tal situação interrogante, ou mesmo na falta de coragem para tal, fugiram para o fideísmo, que não é uma reabilitação da metafísica, mas situa-se na esteira imanente da racionalidade moderna. Também muitos são aqueles que, diante da crise da razão moderna (que não mais dá conta de explicar a realidade!), ousam falar de fé, de uma transcendência ética ou religiosa, mas o fazem sem uma reflexão crítica que admita o contraditório. Dizem que a verdade ou a falsidade das afirmações é apenas uma questão de fé, ou seja, deve-se admitir racionalmente a possibilidade de crer em um mundo transcendente, mas a verificação de tal crença não poderá suportar a falsificabilidade, não poderá se submeter ao controle da razão.

Em busca de respostas para as questões existenciais e coetâneas, Lima Vaz buscou e abriu caminhos para se pensar o transcendente divino sem deformá-lo. Para ele, um trabalho filosófico de linha especificamente cristã consiste na re-elaboração contínua das perguntas e respostas que concernem à pertinência recíproca entre a filosofia cristã como passado da filosofia moderna e o universo simbólico das “razões elaboradas e codificadas” no domínio da modernidade. Percebe-se a fidelidade do filósofo às questões de amplitude e seu esforço para transcender os limites do seu tempo, mas sempre a partir da imanência à história vivida, a qual inclui a visão crítica dos limites dessa história. O dever do filósofo, segundo Lima Vaz, é o de realizar um ensaio sempre recomeçado, de forma rememorativa, articulando os problemas do presente àqueles que a tradição nos legou na longa tessitura histórica.

O historiador da Filosofia no Brasil, Jorge Jaime, da Academia Brasileira de Filosofia, intitula o capítulo dedicado ao Padre Vaz “O homem é abertura para o outro e criador da história. A história é liberdade” (História da Filosofia no Brasil, v. 3, p. 279-294. A obra completa é de quatro volumes, publicados pela Editora Vozes, RJ, em co-edição com as Faculdades Salesianos, SP, 2000). Em seu texto, Jorge Jaime nos diz que Lima Vaz tem consciência de que o cristianismo não é apenas uma doutrina, mas um fato. O cristianismo é profundamente fatual e histórico, como se comprova em sua obra de 1968, Ontologia e história. O humanismo cristão é marcado pelo teocentrismo, é um humanismo de encarnação, por ser um humanismo marcado pela ação do homem, pela teleologia do homem na história, pela dimensão temporal e pela transformação do mundo.

Por ser um filósofo conhecedor profundo da História da Filosofia, Lima Vaz não se deixou intimidar pelo interdito moderno e contemporâneo feito à metafísica, pois ela é uma dimensão irrenunciável da filosofia, sob pena de esta deixar de existir. É a metafísica a busca das origens, da radicalidade, das raízes, e o insigne jesuíta, como aqueles que buscam as nascentes dos grandes rios – Amazonas, Nilo, para citar apenas os dois maiores – foi buscar as raízes de seu filosofar em Platão, Aristóteles, Tomás de Aquino, Agostinho e Hegel, ensinando-nos que não basta conhecer os rios pelos mapas ou os filósofos pelos manuais. É preciso ir às fontes abundantes – duc in altum! (Lc 5,4) – ou ir às raízes profundas se se quer edificar algo que tenha as características daquilo que vence o tempo presente.

A sociedade contemporânea, examinada e interpretada sob múltiplos aspectos, vem se constituindo dentro de um ambiente de individualismo e caracteriza-se, segundo Lima Vaz, pela fragmentação da imagem do homem; pela compreensão pluriversal do homem; pelo predomínio da relação de objetividade ou da relação instrumental, na sua forma de compreensão explicativa ou tecnocientífica do fato social; pela precariedade do efetivo reconhecimento intersubjetivo, na sua forma universalizada pelo fenômeno da globalização; e ainda pela abrangência da sua crise de sentido. Diante de tal realidade, o projeto filosófico de Lima Vaz é animado por um princípio conceptual unificador das linhas explicativas do fenômeno humano, sem ceder a reducionismos – fideísmo dogmático ou evasão mística, por exemplo – frequentemente encontrados em diversos pensadores. Esse princípio de unidade, para Lima Vaz, está na referência ao Absoluto, como termo intencional da categoria de transcendência.

Fugindo dos reducionismos muito comuns em nosso tempo, o homem vazeano é compreendido como uma unidade triádica aberta ao mundo, aberta ao outro e aberta ao Absoluto, e só assim o homem se realiza plenamente como pessoa. O homem não se reconhece na relação não-recíproca com o mundo-natureza, mas tão-somente em sua relação intencional e recíproca com os outros sujeitos. Ilustrando isso, podemos dizer – se bem entendemos o livro do Gênesis – que Adão-Homem não se reconheceu ao contemplar as maravilhas do Éden, mas só se reconheceu como homem ao contemplar-se em Eva-Mulher: essa, sim, é carne da minha carne, é osso dos meus ossos! (Gn 2, 23).

Esse encontro de pessoas, segundo Lima Vaz, essa relação dual eu-tu, é o elemento fulcral da concepção da história e da sociedade, que, por sua vez, constituem o campo semântico para a compreensão da categoria da intersubjetividade. No entanto, nem a história e nem a sociedade se identificam com o ser do homem e, por isso, o discurso filosófico não pode encontrar o seu termo último no horizonte da comunidade humana. O homem, ser livre e inteligente, não esgota o seu ser no horizonte do mundo e da história: o homem é um ser-para-o-Absoluto (Antropologia filosófica I, p. 239): Fecisti nos ad Te, disse Santo Agostinho. Com João Paulo II poderíamos acrescentar: como poderia ser considerado autêntico um uso da liberdade que se recusa a se abrir àquilo que permite a realização de si mesmo? (Fides et Ratio - FR, 13) ou ainda: “Verdade e liberdade, com efeito, ou caminham juntas, ou juntas miseravelmente perecem “ (FR, 90), disse o pontífice-filósofo.

Para o Padre Vaz, religião e fé não eram algo extrínseco com o qual se relacionava: nelas vivia e delas se alimentava espiritualmente (DRAWIN, Carlos. Síntese, Belo Horizonte, v. 29, n. 94, 2002, p. 151). Vivia naquele ambiente que João Paulo II descreveu como sendo o lugar em que “o intellectus fidei requer o contributo de uma filosofia do ser” (FR 97). Lima Vaz, segundo seus amigos e confrades, não experimentava conflitos interiores a respeito da compatibilidade entre suas convicções religiosas e sua profissão de filósofo e professor de filosofia, pois desde o início guiara-se pela diretriz de Santo Agostinho “crê para entenderes e entende para creres”, como se pode ver nos capítulos II e III da encíclica Fides et Ratio, de João Paulo II. Essa dialética agostiniana entre fé e razão assegurou-lhe uma convivência fecunda entre a fé que professava e a razão que praticava. Seu trabalho filosófico manteve-se rigorosamente dentro das exigências metódicas e doutrinais da razão, e todas as vezes que atingia as fronteiras onde a razão se encontra com a fé essa linha divisória era explicitamente traçada.

A solidez de sua vasta cultura científica e humanística proporcionou ao Padre Vaz uma visão abrangente da teologia cristã, da história e literatura ocidentais, das ciências humanas e naturais. Extraordinária erudição filosófica lhe conferiu um conhecimento invejável do conjunto do pensamento ocidental.

Radicado, portanto, na tradição filosófico-teológico-espiritual cristã, longe de rejeitar a configuração racional que as categorias do pensamento grego deram à experiência neotestamentária, reconheceu neste encontro gerador da civilização ocidental um duplo ganho: para a fé, a possibilidade de justificar-se através de um discurso com pretensão universal; para a razão filosófica, a abertura de horizontes insuspeitados para a compreensão da existência humana. Desde sua tese de doutoramento não deixou de aprofundar o estudo da filosofia grega, facilitado pelo domínio desta língua que lhe assegurava a familiaridade com as obras de Platão e de Aristóteles. Entretanto, foi em autores cristãos que buscou os elementos básicos de sua construção sistemática. Grande admirador de Santo Agostinho e conhecedor profundo da filosofia medieval, identifica as raízes do pensamento moderno nas correntes responsáveis pela desagregação da grande síntese tomasiana. De fato, como afirmou seu confrade jesuíta Paulo Menezes, professor da Universidade Católica de Pernambuco, seu autor predileto de Lima Vaz é, sem dúvida, Tomás de Aquino, mestre insuperado, não porque depois dele a problemática filosófica não tenha atingido profundidades antes impensáveis, mas pela lucidez e equilíbrio de sua abordagem das questões fundamentais, ainda hoje capaz de fecundar a reflexão (Vaz e Tomas de Aquino, in: MAC DOWELL, João A. Saber filosófico, história e transcendência, p. 65-69).

Para encerrar, retomando o tema da VIII Semana de Filosofia ¬– "O pensamento filosófico cristão no século XX" –, embora consideremos o Padre Vaz como um pensador cristão e católico, um “diácono da verdade” (FR, 2) o seu pensamento não pode ser reduzido a “pensamento cristão” e sua filosofia não pode se reduzir a uma “filosofia cristã”. Explico-me: Podemos dizer que há um pensar cristão que considera, dentre outras características, a criação do mundo e a encarnação do Verbo Divino, elementos que os gregos nem sequer suspeitariam serem mencionados. Mas esse pensar cristão, para ser verdadeiro, deve poder se encaixar entre as colunas da razão e, assim construir um edifício sólido que todos reconheçam como válido e no qual todos possam entrar e se reconhecerem. Assim sendo, a reflexão de Lima Vaz, a nosso ver, mesmo partindo de alguém impregnado dos cânones cristãos, segue, contudo, aquela luz fundamental que ilumina todo aquele que se abre ao maravilhar-se do mundo; sua reflexão antropológica, por exemplo, notadamente marcada pela abertura ao transcendental, é de grande valor para o cristianismo e para todos os credos que admitem a existência de um Princípio Criador, mas sua filosofia não é uma ancilla theologiae, pois vai além dos cânones cristãos, mas não contra eles. Mesmo sendo cristão e sacerdote católico, Padre Vaz, ao buscar respostas para as questões do homem de fé ou não, não emigra para o fideísmo dogmático, ou se refugia numa praxeologia voluntarista, ou se evade para uma mística que mascara as questões humanas fundamentais.

Encontramos, sim, em Lima Vaz uma justificativa que legitima um pensar cristão, mas que nele não se fecha, mas vai além dos paradigmas colocados na cultura ocidental pelo fato inquestionável da tradição cristã. Lima Vaz, como todo filósofo, transpõe em conceitos o existir histórico de seus coetâneos, e o faz a partir da razão e da memória ruminada e transformada, transubstanciada no exercício da contemplação e da escrita.

Não busca o filósofo, em seu exercício nada lúdico, apenas as superfícies dos fatos, pois elas, antes de revelarem causas, escondem muitas vezes os sintomas que podem levar às causas que repousam em profundidades antigas, elaboradas por Kant em quatro perguntas fundamentais: o que posso saber? O que devo fazer? O que me é permitido esperar? O que é o homem? (Crítica da razão pura, A 805, B 833; Antropologia filosófica, p. 9) Tais perguntas são feitas por cada ser humano que vem ao mundo, e é a elas que Lima Vaz procurou dar respostas em seu filosofar de quase seis décadas.

Em busca de compreender o momento presente, o momento moderno, “agoral”, ou seja, o nosso tempo, Lima Vaz, aproveitando a chegada da encíclica Fides et Ratio (FR), de João Paulo II, brindou-nos com um excelente comentário, dando-nos luzes para enxergamos na escuridão do túnel.

Em setembro de 1999, no mesmo mês em que João Paulo II publicou a encíclica FR Padre Vaz, numa conferência realizada no Núcleo de Estudos Teológicos (NET), da PUC Minas, analisou o texto pontifício e justificou o seu sentido de atualidade permanente e de atualidade conjuntural. Tentarei fazer, aqui, um resumo daquilo que disse o nosso filósofo. (Henrique C. de Lima Vaz, Metafísica e fé cristã: uma leitura da Fides et Ratio. Síntese, v. 26, nº 86, 1999, p. 293-305)

Disse-nos que uma causa única, necessária e suficiente, agiu decisivamente no sentido da ruptura da meta-analogia entre Fé e Razão: a imanentização da Transcendência e a consequente leitura materialista de Aristóteles feita por Ibn-Rosch (Averróis) no século XII e adotada na Universidades no século XIII, resultou no Nominalismo que, em formas diversas, chegou ao século XVII causando a polaridade de tensão entre as “razões da fé e as razões da razão”.

Não foi o famoso episódio da condenação de Galileu o marco teórico dessa ruptura, mas sim as Regulae ad directionem ingenii (1629), de R. Descartes, pois indicavam os rumos de uma nova ciência ou nova filosofia. O texto cartesiano iniciou o processo teórico da transposição da transcendência real para a transcendência lógica, o que significou a primazia do sujeito sobre o “ser” e soberania matemática no universo intelectual.
Ocorreu também a passagem de uma estrutura teocêntrica para uma estrutura antropocêntrica da Razão. Vieram as metafísicas racionalistas, como a de Kant, um século e meio depois de Descartes.

A imanentização lógica da transcendência tornou inviável a proposição de uma nova meta-analogia entre Fé e Razão. Os dois termos estão em confronto. O lógico é o domínio do operável; a razão moderna é essencialmente operacional, e a operação da razão passa sob o domínio completo do sujeito, dando origem ao processo pretendidamente autônomo e sem fim, designado como “mau-infinito” por Hegel.

Lima Vaz conclui o seu comentário dizendo que, embora a razão moderna avance pela vertente antropocêntrica, a orientação para o pólo transcendente real que está na origem da razão bíblica e da razão grega aparece como tendência irreversível da Razão no sentido mais amplo e aflora aqui e acolá mesmo no seio da razão moderna. Esse não é um problema para ser tratado apenas dentro dos muros dos Institutos superiores ou das Universidades, mas deveria tomar conta de nossas conversas e impregnar nossa cultura.

Eis, portanto, meus caros amigos, algumas pistas deixadas por Padre Vaz e agora trazidas por mim a este Seminário, com simplicidade. Espero ter sido útil, pois assim terá sentido a minha presença.

Muito obrigado pela atenção de todos.

Prof. Pe. Ismar Dias de Matos, PUC Minas.

Caratinga/MG, 05 de outubro de 2010.


UM RESUMO DA FILOSOFIA TOMISTA

Em sua preocupação em harmonizar razão e fé, João Paulo II insistia em recuperar a tradição tomista porque São Tomás, na Idade Média, foi o primeiro pensador a realizar esse trabalho, ressaltando a plena autonomia da razão em face da fé, sem o risco de aceitar a tese da dupla verdade: uma verdade que é própria da razão e outra que é afirmada pela fé, tese sustentada pelos averroístas latinos. Assim, o presente artigo, sem maiores pretensões, deseja apresentar aos alunos do Curso de Filosofia da PUC Minas, algumas pistas para um estudo do pensamento tomista e sugestão de leituras atuais e abalizadas sobre esse tema.
O filósofo jesuíta Henrique Cláudio de Lima Vaz, falecido em maio de 2002, durante sua profícua atividade intelectual, antecipou o desejo de João Paulo II, publicando importantes textos atualizando o pensamento de São Tomás.
Embora tenha vivido em um exíguo espaço de tempo, São Tomás de Aquino (1225-1274) produziu uma extensa obra: Comentário sobre as sentenças, Suma contra os gentios e a famosa SumaTeológica. Para que se tenha uma visão geral desse grande pensador, são apresentadas, abaixo, algumas teses que contêm o essencial de sua filosofia teorética, que foram resumidas pelo jesuíta Guido Mattiussi, professor na Universidade Gregoriana, de Roma. Em 1916 a Santa Sé aprovou esse resumo e
a Sagrada Congregação dos Seminários o recomendou aos estudantes. O texto, aqui dividido didaticamente em quatro tópicos, chegou ao autor deste artigo através do Pe. Dr. Celso de Carvalho (1913-2000), professor de Filosofia no Seminário Arquidiocesano de Diamantina, que foi aluno do Padre Mattiussi, em Roma, na década de 1940.

I Metafísica

1. Potência e ato de tal modo dividem o ente, que tudo quanto existe ou é ato puro ou resulta necessariamente de potência e ato como suas partes ou princípios intrínsecos.
2. O ato, como perfeição, só é limitado pela potência, que é capacidade de perfeição. Portanto, na ordem em que há um ato puro ele é necessariamente infinito e único; pelo contrário, onde ele é finito e multíplice, aí ele entra em verdadeira composição com a potência.
3. Por isso, na absoluta razão (conceito, aspecto) do ser mesmo, só Deus é que subsiste, uno e simplicíssimo; tudo o mais que participa do ser tem uma natureza, na qual o ser é contraído; tudo o mais consta de essência e existência como princípios distintos.
4. O ente (denominação que lhe vem do esse ou ser) não é predicado univocamente de Deus e das criaturas, mas não é predicado tampouco equivocamente; mas analogicamente – tanto por analogia de atribuição como pela analogia de proporcionalidade.
5. Além disso, há em toda criatura a composição real de sujeito subsistente com formas acrescentadas secundariamente, isto é, acidentes; essa composição, porém, não poderia ser entendida, se o esse não fosse realmente recebido numa essência distinta.
6. Além de acidente absoluto, existe ainda o relativo (relação ou ad aliquid). Com efeito, embora o ad aliquid não signifique no seu conceito (ratio) exato, algo inerente a algo, tem, frequentemente, sua causa nas coisas reais e, portanto, numa realidade distinta do sujeito.
7. A criatura espiritual é absolutamente simples na sua essência. Resta-lhe, no entanto, uma dupla composição – essência e existência; ou substância e acidentes.

II Somatologia

1. Quanto à criatura corporal, é composta, na sua mesma essência, de potência e ato; tais potência e ato na ordem da essência recebem nomes de matéria e forma.
2. Nenhuma dessas duas partes tem o ser por si nem é produzida ou se corrompe per se, nem é colocada entre os predicamentos a não ser reductive, como princípio substancial.
3. Embora a extensão em partes integrantes acompanhe a natureza corporal, não é a mesma coisa para o corpo ser substância e ser de tal quantidade (quantum). Com efeito, a substância por si mesma (ratione sui) é indivisível, não como ponto mas como algo que está fora da ordem da dimensão; a quantidade, que confere extensão à substância, difere realmente da substância e é um verdadeiro acidente.
4. A matéria marcada pela quantidade é o princípio de individuação, isto é, da distinção numérica (que não pode existir nos puros espíritos) entre dois indivíduos da mesma natureza específica.
5. É também graças à quantidade que um corpo fique circunscritivamente locado e só possa estar, desse modo, em um só lugar, qualquer que seja a potência.
6. A densão dos corpos é bipartida: viventes e não-viventes. Nos viventes, para que no mesmo sujeito existam per se parte movente e parte movida, uma força substancial chamada alma exige uma disposição orgânica ou partes heterogêneas.
7. As almas de ordem vegetal e sensitiva de forma alguma subsistem por si nem são produzidas por si, mas são tão somente por princípio graças ao qual o vivente existe e vive, e – uma vez que dependem totalmente da matéria – corrompido o composto, automaticamente se corrompem per accidens.

III Psicologia

1. Diversamente às almas vegetal e sensitiva, a alma humana subsiste por ela; quando pode ser infundida num corpo suficientemente disposto, é criada por Deus e, por sua natureza, é incorruptível e imortal.
2. Essa alma racional une-se de tal modo ao corpo, que é sua forma substancial única; por ela o homem existe como homem, e animal, e vivente, e corpo, e substância e ente. Portanto ela confere ao homem todo grau essencial de perfeição, além disso comunica ao corpo o ato de ser, graças ao qual ela mesma existe.
3. Brotam da alma humana, como resultados naturais, duas espécies de faculdades: orgânicas e inorgânicas; aquelas (entre as quais estão os sentidos) radicam-se no composto (corpo e alma); estas, só na alma. Portanto, a inteligência é uma faculdade intrinsecamente inorgânica.
4. A faculdade intelectual acompanha (sequitur) necessariamente a imaterialidade, e isso de tal modo que os graus de afastamento da matéria são também os graus da faculdade intelectiva. O objeto adequado da intelecção é o ente comum; mas o objeto próprio da inteligência humana, no estado atual de união (com o corpo) é limitado às qualidades abstraídas das condições materiais, isto é, os universais.
5. Portanto, é das coisas sensíveis que recebemos o conhecimento. Uma vez, porém, que o sensível não seja inteligível em ato, além do intelecto formalmente inteligente, deve-se admitir na alma uma força ativa que abstraia dos fantasmas as espécies inteligíveis.
6. Por essas espécies inteligíveis conhecemos diretamente os universais; é com os sentidos que atingimos as coisas singulares, mas depois também com a inteligência, por analogia e um retorno aos fantasmas chegamos ao conhecimento das realidades espirituais.
7. A vontade segue o intelecto, não o precede; ela deseja necessariamente o que se lhe apresenta como bem que satisfaça o desejo, de toda parte; mas entre os bens que sejam propostos a um juízo mutável, ela escolhe livremente. Portanto a escolha segue-se ao juízo prático último; mas é a vontade que faz que seja juízo último.

IV Teodiceia

1. Que Deus existe, não o percebemos por intuição imediata nem o demonstramos a priori; demonstramo-lo a posteriori, isto é, pelas coisas que foram feitas levando a argumentação dos efeitos para a causa: portanto, parte-se:
a) Das coisas que são movidas mas não podem ser o princípio adequado do seu movimento para o primeiro movente imovido;
b) Do processo das coisas mundanas de causas subordinadas entre si, à Primeira Causa não causada;
c) Das coisas corruptíveis, que indiferentemente se referem ao ser e ao não ser, ao Ser absolutamente necessário;
d) Das coisas que, numa gradação do menos ao mais, segundo diminuídas perfeições de ser, viver e compreender, são, vivem e compreendem, Àquele que é o maximamente vivo, inteligente, vivente e ente;
e) Finalmente, da ordem do universo a uma Inteligência que pôs ordem, dispôs e dirige ao fim as coisas.
2. A essência divina, por identificar-se com a “atualidade exercida” do próprio ser ou por ser o próprio ser subsistente, é-nos proposta, constituída como que no seu conceito (ratione) metafísico; e por isso mesmo dá-nos a razão de sua infinitude na perfeição.
3. Portanto, pela própria pureza do seu ser, Deus se distingue de tudo o que é finito. Daí se conclui:
a) que o mundo não pôde provir d’Ele a não ser por criação;
b) que a virtude criadora, pela qual primeiramente é atingido o ser enquanto ser, nem por milagre é comunicável a qualquer criatura finita;
c) que nenhum agente criado pode influir no ser qualquer efeito que seja senão por uma noção recebida da causa primeira.

Autor: Prof. Pe. Ismar Dias de Matos, PUC Minas. O presente texto é resultado de apontamento de aulas de Filosofia Medieval e faz parte de um artigo do autor “O humanismo filosófico de João Paulo II”, 2005, publicado em: http://www.ismardiasdematos.com.br/joaopaulo.pdf (as referências bibliográficas completas estão nesse site)

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Curiosidades da Sagrada Escritura

Texto já publicado em 03/06/2013, às 11:46, em: http://www.portalecclesia.com/2013/06/curiosidades-da-sagrada-escritura.html


O primeiro elemento da criação divina, conforme a Sagrada Escritura, foi a luz, que em hebraico é OR, iniciada com Álef (א). Os significados dessa palavra (OR) são incontáveis. Praticamente tudo aquilo que é bom é também luz. Moisés é luz; Jesus é luz! O Gênesis nos revela: “Deus disse: haja luz, e houve luz. Deus viu que a luz era boa, e separou a luz das trevas” (1,3-4). Curiosidade: a palavra OR, iniciada com a também muda letra Áin (ע), significa “pele”.

O Gênesis nos diz que Adão e Eva, criados para a imortalidade, tinham a pele coberta de luz (OR). Quando desobedeceram ao Criador e caíram, pelo pecado, descobriram sua fragilidade e se perceberam “nus”. Ou seja, a luz divina que recobria a pele deles desaparecera e aí, então, viram apenas a sua pele (OR). O pecado fez com que se tornassem frágeis, limitados, e expulsos da presença divina. Porém, uma esperança restava ao homem: uma promessa, é (Gn 3,15), que é um protoevangelho a nos apontar uma prefiguração da Virgem Maria, aquela que esmaga a serpente e nos dá o Salvador.

Nas Escrituras, a palavra “Eu” escreve-se “Any”, com a inicial muda Álef (א), que é a primeira letra do abecedário hebraico. Ela é a primeira letra do nome Pai (Áb). Pode-se dizer que o sustentáculo do nosso “Eu” é a força do Criador e Pai. Sem tal força, nós nos tornamos pobres, como diz a Oração litúrgica: “Ó Deus, Sois o amparo dos que em Vós esperam e, sem vosso auxílio, ninguém é forte, ninguém é santo...” E aqui reside outra curiosidade: a palavra “pobre” também tem a mesma sonoridade de “Eu”: é “Any”; mas seu início é com a letra hebraica Áin (ע).

Tornemo-nos aprendizes constantes da Sagrada Escritura, pois ela é nosso caminho, nosso pão, nossa força. Jesus, Senhor e Cristo, é a Palavra de Vida Eterna, como nos diz o evangelista João (6, 68).



Padre Ismar Dias de Matos, Colunista do Portal Ecclesia, Mestre em filosofia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Professor de filosofia e cultura religiosa na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.

Entender as Escrituras com o coração

Texto já publicado em 02/05/2013, às 20:28, http://www.portalecclesia.com/2013/05/entender-as-escrituras-com-o-coracao.html

A primeira letra da Torah Hebraica é Beit, que está na palavra Bereshit (que significa “no começo, no princípio); a última letra é Laméd, final da palavra Ishrael. Beit, além de ser a segunda letra do alfabeto hebraico, também significa casa. Vejamos, com a imaginação das crianças, a letra Beit que, com uma pequena diferenciação, também é lida como Veit: ela tem porta, teto e chão, como uma casa: ב

A Palavra de Deus é casa, é refúgio que nos abriga. Casa é seio: Seio de Abraão! Israel é casa. A esposa é casa. A família também é casa. O ser humano é casa, é morada do Espírito (Ruáh). A Arca de Noé (a Igreja) é casa. Jesus é casa. O Universo é Oikós, a grande casa.

A última letra da Torah (Laméd) é a mais alta de todas; parece um camelo; é camelo: לOs sábios que nos ensinam as Escrituras dizem que se uníssemos todas as letras da Torah, da primeira à última, passando no meio delas um fio, como se construíssemos um colar, veríamos que, quando a primeira letra (Beit ou Veit) tocasse a última (Laméd), poderíamos dizer que a última tornou-se, então, a primeira, ao formar o elo; formaríamos, assim, a palavra LeV, que significa, em hebraico, coração (ב ל). “Amarás o Senhor teu Deus de todo o coração” (Dt 6,5), eis o primeiro e grande mandamento.

Apenas o coração, sede da sabedoria, nos dá capacidade para ver e saborear a beleza e o mel que brotam das Sagradas Escrituras. Só se vê bem com o coração, disse Saint-Exupéry. O essencial é invisível aos olhos, ao cérebro, à razão. Sabedoria e sabor têm a mesma raiz. O sábio é aquele que degusta os ensinamentos e depois os transmite.

Conhecer as Escrituras Sagradas, do começo ao fim, é deixar-se impregnar por elas. Que entendamos aqui o verbo conhecer com o significado que lhe deu a Virgem Maria, Mãe de Jesus: “Como vai acontecer isso, se não conheço homem algum? (Lc 1,34). Conhecer algo é deixar-se impregnar ou engravidar-se por ele. O que é conhecido passa, então, a fazer parte de nós, nasce dentro de nós. As Sagradas Escrituras, meditadas dia e noite, devem tornar-se carne de nossa carne.

É preciso estar atento, rezar em todo o tempo, no Espírito (Ef 6,18). Aí poderemos até dormir, pois o sono é necessário ao Corpo-casa. Dormir sem perder o pensamento no(do) Senhor: "Eu durmo, mas meu coração vigia" (Ct 5,2).

Padre Ismar Dias de Matos, Colunista do Portal Ecclesia, Mestre em filosofia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Professor de filosofia e cultura religiosa na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.