sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Testamento de Dom Joaquim Silvério de Souza

“Em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo. Amém.

Por este instrumento, por mim escrito, datado e assinado, para valer como meu codicilo, de acordo com os artigos 1651 e 1655 do Código Civil Brasileiro, eu Joaquim Silvério de Souza, primeiro Arcebispo da Arquidiocese de Diamantina, filho do Capitão Antônio de Souza Monteiro e Dona Anna Felícia Policena de Magalhães, estando em pleno gozo de minhas faculdades mentais, faço esta declaração do que se deve cumprir após meu falecimento e para que se saiba a verdade quanto aos bens por mim havidos ou como tais considerados, ou sob minha administração.

Como é meu dever, agradeço a Deus todas as graças espirituais e temporais a mim concedidas, e humildemente lhe suplico perdão de todos os pecados, infidelidades à graça, negligências, omissões, de que me tornei culpado durante o curso da vida, e de modo particular no exercício do ministério sacerdotal e pastoral.

No propósito de exalar o último alento firme na fé de tudo quanto ensina a Santa Igreja Católica, em cujo seio tenho a felicidade de viver, e da qual apesar de indigno, tenho a honra de ser ministro, entrego minha alma a Deus pelas mãos de Maria Imaculada, cujo especial amparo, assim como o patrocínio de seu castíssimo esposo, São José, a proteção de São Joaquim, de Santo Antônio, principal Patrono da Arquidiocese, do meu Anjo Custódio, invoco para os meus derradeiros momentos de vida na terra.

Não só aos que mais de perto me ajudaram a levar o peso da administração do Arcebispado, mas a todos os sacerdotes e fiéis sob minha jurisdição, os agradecimentos a quem têm direito pelos serviços que prestaram e consolações que deram à minha alma, e a quem de qualquer modo contristei os sentimentos do meu pesar e o pedido de sua indulgência para comigo.

Desejo que as Missas a que tenho direito e as que deixo recomendadas sejam celebradas quanto antes. Dos sacerdotes e fiéis deste Arcebispado e das Dioceses que outrora formaram o Bispado de Diamantina, e são hoje sufragâneas desta Igreja Metropolitana, espero a caridade de suas intercessões diante de Deus em meu favor.

Na campa da sepultura que recolher meus ossos, desejo, caso seja possível, se leiam, como contínua invocação minha, as palavras: SPES MEA, DOMINE, MISERICORDIA TUA.
Declaro que de meu não possuo coisa alguma.

A meus irmãos ou a filhos seus dei, já há anos, por instrumento legal, e observada também a legislação canônica, alguns alqueires de terra que na Freguesia de São Miguel do Piracicaba (atual Vila Rio Piracicaba) constituíram por doação de meus pais, patrimônio para minha ordenação, e no mesmo fim dispus da pequena herança destes havida.

Como consta de certidão oficial existente na Secretaria do Arcebispado, dei à Mitra Arquidiocesana os livros que me pertenciam e para ela foram adquiridos os posteriores à doação.
A ela pertencem todos os paramentos, imagens, alfaias, sacros utensílios, objetos de qualquer natureza existentes no Palácio e que não pertençam a outras pessoas.

Simples administrador dos bens da Mitra, nada para mim reservei ainda do que me podia pertencer segundo as leis canônicas, mas tudo, tirado o necessário para minha manutenção, empreguei para o bem da Arquidiocese, principalmente na educação da juventude e amparo das vocações sacerdotais.
Tendo em vida feito o que pude aos que me são mais próximos em sangue, como declarado ficou acima, e não podendo lhes deixar bens temporais, que não possuo, peço que vivam sempre como bons filhos da Igreja e mantenham honrado o nosso nome de família.

Aos Exmos. Srs. Dom Antônio José dos Santos, que me tem feito a caridade de sua valiosa cooperação durante anos e, na sua falta, a Monsenhor Levi Pires de Oliveira, e, no impedimento deste, a Monsenhor Gabriel Amador dos Santos ou a seu sucessor na Secretaria do Arcebispado, aos quais todos renovo minha eterna gratidão, rogo o favor de fazer que se execute, de acordo com a legislação do País, esta minha disposição ou declaração de última vontade.

Rogo, enfim, a Deus que me conceda a graça de servi-Lo menos imperfeitamente do que até hoje, durante os dias que por sua infinita misericórdia ainda viver sobre a terra (*).

Diamantina, 09 de fevereiro de 1929.

Dom Joaquim, Arcebispo de Diamantina”.

Obs: Eu, Ismar Dias de Matos, sou associado efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais e ocupo a cadeira 75, cujo patrono é Dom Joaquim Silvério de Souza.

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(*) Dom Joaquim faleceu no dia 30 de agosto de 1933, em Diamantina. Em 1959, quando completaria 100 anos, foi homenageado com a edição de um selo postal, certamente homenagem de JK.

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