As festas juninas e julinas fazem parte de nossa cultura popular, de nosso folclore, palavra derivada da língua alemã: Volk-Lore. São festas que nos remetem às nossas memórias, às nossas tradições, às nossas raízes. Quanto mais quisermos crescer para cima, mais teremos que nos firmar em nossas raízes, sob pena de sucumbirmos aos vendavais e tempestades da moda e da modernidade.
É interessante observar que cada um de nós é fruto de um passado, de uma história recente e remota, conservada pela oralidade e pela escrita. Nosso presente é resultado dos anos, séculos e milênios vividos pelos que nos antecederam. Em nossa educação para a vida, assimilamos esse conteúdo e o revalorizamos. Assim formamos nossa ética, nossas leis, nossos costumes, esse patrimônio de humanidade que dá sentido à nossa vida.O Brasil possui inúmeras e riquíssimas expressões de cultura popular. Se quisermos olhar apenas para Minas Gerais já veremos expressões muito variadas. É muito importante celebrá-las, bem como registrá-las em vídeos, em livros, para que não se percam e continuem a orientar os que vierem depois de nós. A celebração dessas tradições reforça os nossos laços comunitários de um modo prazeroso e lúdico.
No início do século passado, um dos fundadores do atual Estado de Israel, David Ben Gurion (1886-1973), percebeu que uma forma de aumentar o sentimento de nacionalidade no povo judeu era o cultivo de uma língua comum. Ele percebera que a língua hebraica, que já havia sido um patrimônio comum, estava sendo esfacelada e esquecida; apenas uns poucos a conheciam. Predominavam na região o inglês e o árabe. Ben Gurion começou, então, a ensinar hebraico a seus irmãos judeus. E foi um projeto bem sucedido. Israel tornou-se um estado independente em 1948.
Os povos gregos foram dominados militarmente pelos romanos, mas os romanos foram dominados pela cultura grega que se sobrepôs ao dominador. A Inglaterra poderia transportar seus reis e príncipes, no dia de seu casamento, em automóveis ultramodernos, mas prefere fazê-lo seguindo tradições multisseculares. Há um exemplo mais convincente do que esse? As raízes da cultura escapam das armas e de tudo o que é passageiro.
Não tenhamos medo ou vergonha de mantermos tradições regionais, nossas músicas, nossas danças, nossas comidas típicas... nossa identidade, enfim. (Ismar Dias de Matos, mestre em filosofia (UFMG), professor de filosofia e cultura religiosa na PUC Minas: p. ismar@pucminas.br )
segunda-feira, 20 de junho de 2011
sexta-feira, 17 de junho de 2011
A menina e o presidente
Quando foi presidente da república (1979-1985), o general João Batista Figueiredo colecionou célebres episódios. Uma vez, quando foi interrogado por uma colegial sobre o que faria se ganhasse o salário mínimo, respondeu que daria um tiro na cabeça. A assessoria tentou abafar a estúpida resposta, dizendo que o presidente quis dizer que daria “um tiro na cabeça do salário mínimo injusto” etc. Noutra ocasião, o general-presidente disse preferir o cheiro de cavalos ao cheiro de pessoas.
É também desse último presidente da ditadura militar (1964-1985) a antológica frase a respeito daqueles que não acreditassem em seu projeto de redemocratização. Aos descrentes prometia prender e arrebentar: “Quem não acreditar, eu prendo e arrebento!” Democracia com prisões e cassetetes. Que coisa esquisita!
Mas o que eu gostaria de comentar é a célebre foto de Figueiredo com a então garotinha Rachel Clemens, em 1979, em cerimônia no Palácio de Liberdade em Belo Horizonte. A garota aparece de braços cruzados enquanto o general tenta cumprimentá-la com um aperto de mão. A menina nada sabia de política, mas a fotografia, de autoria de Guinaldo Nicolaevsky, já falecido, transformou-se em mais um símbolo da insatisfação com o governo militar.
O motivo do não-cumprimento não importa. O que importa mesmo é sentido que foi dado à fotografia que percorreu o mundo. A hermenêutica do fato pode ser muito maior do que o próprio fato em si.
P.S: A foto está no Blog de Rachel Clemens. É do Blog da Rach. Vejam: http://blogdarachelmcs.blogspot.com/2011/03/garotinha-que-nao-deu-mao-para-o.html (Ismar Dias de Matos)
É também desse último presidente da ditadura militar (1964-1985) a antológica frase a respeito daqueles que não acreditassem em seu projeto de redemocratização. Aos descrentes prometia prender e arrebentar: “Quem não acreditar, eu prendo e arrebento!” Democracia com prisões e cassetetes. Que coisa esquisita!
Mas o que eu gostaria de comentar é a célebre foto de Figueiredo com a então garotinha Rachel Clemens, em 1979, em cerimônia no Palácio de Liberdade em Belo Horizonte. A garota aparece de braços cruzados enquanto o general tenta cumprimentá-la com um aperto de mão. A menina nada sabia de política, mas a fotografia, de autoria de Guinaldo Nicolaevsky, já falecido, transformou-se em mais um símbolo da insatisfação com o governo militar.
O motivo do não-cumprimento não importa. O que importa mesmo é sentido que foi dado à fotografia que percorreu o mundo. A hermenêutica do fato pode ser muito maior do que o próprio fato em si.
P.S: A foto está no Blog de Rachel Clemens. É do Blog da Rach. Vejam: http://blogdarachelmcs.blogspot.com/2011/03/garotinha-que-nao-deu-mao-para-o.html (Ismar Dias de Matos)
quarta-feira, 8 de junho de 2011
Discípulos de São Tomé?
Muitas são as pessoas que se dizem discípulas de São Tomé porque só acreditam naquilo que veem. Talvez não percebam que a maioria daquilo que constitui o nosso patrimônio cultural é composto por algo que não vemos, não tocamos, ou seja, não faz parte de nosso mundo sensível.
Os cientistas da astronomia, por exemplo, não conhecem o universo, não o sabem por inteiro, mas criaram dele um “modelo” a partir de uma aposta científica, que pode ser chamada de “paradigma”. Assim também se comportam os cientistas da física: eles não veem elétrons, prótons e nêutrons. As funções de cada um desses é descrita, mas eles não são visíveis nem mesmo em aparelhos sofisticados.
Na verdade, os cientistas partem de uma aposta científica e, com ela, tecem uma rede teórica (paradigma) com a qual captam seus peixes (ou seja, seus objetivos). É preciso, primeiro, “crer” para “ver”. Cientistas e místicos, portanto, partem de uma aposta teórica e de fé, respectivamente. Os dois grupos não são opostos, mas podem ser até complementares. Não há lugar na ciência para os pouco informados “discípulos de São Tomé”.
Um “gole” ou uma pequena dose de ciência pode levar alguém ao ateísmo. Vários goles ou muitíssimos goles podem levar alguém ao deslumbramento, à busca dos mistérios que a natureza vai nos revelando aos poucos. O verdadeiro cientista é um humilde interrogador da verdade. A verdade encontrada nunca se apresenta completa, mas sempre é possível acrescentar-lhe algo.A Bíblia nos fala que “no princípio era a Palavra. A palavra estava com Deus e a Palavra era Deus” (João 1, 1). E ainda, a Palavra de Deus é Luz: “Essa luz brilha nas trevas, e as trevas não conseguiram apagá-la” (João 1,5). A carta aos Hebreus nos diz: “Sabemos que a Palavra de Deus formou os mundos; foi assim que aquilo que vemos originou-se de coisas invisíveis” (Hebreus 11,3).
Alguém que tomou “um gole” de ciência poderá não valorizar os textos bíblicos citados, mas essa mesma pessoa acreditará na ciência que afirma: cerca de 95% do universo não pode ser visto, pois é composto da “matéria escura”, ou seja da “matéria primordial” chamada de “partícula de Deus”. Na verdade, é a ignorância que nos afasta de Deus, não a ciência.
Ismar Dias de Matos, mestre em filosofia, é professor de cultura religiosa e filosofia na PUC Minas: p.ismar@pucminas.br
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