Atos contra queima do Corão por pastor chegam a Cabul e Candahar; Houve também algumas manifestações em Herat e Tahar; analistas temem efeito bola de neve no mundo islâmico (DAS AGÊNCIAS DE NOTÍCIAS (FOLHA DE SÃO PAULO, 03 de abril de 2011)
Os protestos contra a queima do Corão por um pastor americano no dia 20 de março se espalharam pelo Afeganistão. Chegaram ontem a Candahar, coração da insurgência Taleban no país, deixando nove mortos.
Anteontem, sete funcionários da ONU em Mazar-i-Sharif (norte) tinham sido mortos em um ataque ao prédio da entidade na cidade.
Em Candahar centenas de manifestantes, com bandeiras do Taleban e cartazes pedindo "morte à América", colocaram fogo em carros e destruíram lojas.
Como costuma ocorrer, quase todos eram homens jovens. Além dos mortos, 81 ficaram feridos. Salas de aula de uma escola para meninas e um ônibus escolar foram destruídos -o Taleban é contra a educação feminina.
O movimento fundamentalista negou ter orquestrado o protesto, dizendo que ele era apenas a "manifestação do povo islâmico".
Na capital, Cabul, a Otan reprimiu um ataque a uma das suas bases. Dois homens-bomba vestindo burcas (traje feminino) foram mortos antes que se explodissem. Três soldados ficaram levemente feridos.
Além disso, outras regiões, como Herat e Tahar, tiveram manifestações, sem mortes.
Os protestos foram convocados pelos sermões da última sexta-feira, dia de orações entre os islâmicos.
Na sexta-feira anterior, porém, ninguém tinha dado atenção à queima do Corão pelo pastor Terry Jones, da Flórida, ainda que ele já tivesse incinerado a obra.
Quem atraiu a atenção para a queima que tinha passado despercebida foi o presidente do Afeganistão, Hamid Karzai. Ele fez um discurso na quinta dizendo que Jones deveria ser preso.
Ontem, o presidente dos EUA, Barack Obama, condenou a queima do Corão, classificando a ação como um "ato de extrema intolerância e preconceito".
O medo dos especialistas é que os protestos, num efeito bola de neve, levem o Afeganistão (e, no pior dos casos, o mundo islâmico) a um cenário ainda mais instável.
"A raiva contra os estrangeiros, que se manifesta contra militares, ONGs, a ONU e outros atores, precisa apenas de uma pequena faísca para gerar um grande incêndio", diz Thomas Ruttig, diretor da Rede de Analistas do Afeganistão, organização que promove debates e publicações sobre o país.
A opinião de Ruttig condiz com depoimentos dos afegãos nas ruas. O lojista Rahim Mohammad, por exemplo, diz "não sentir pena pelos funcionários da ONU mortos". "Nosso povo é massacrado pelos estrangeiros todos os dias."
Original publicado em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft0304201101.htm Acesso dia 03/04/2011)
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